Os Tigres de Bengalas

julho 15, 2022

OS TIGRES DE BENGALAS

Texto Adulto de: Paulo Sacaldassy

PERSONAGENS

Juvenal

Maneco

Zeca

CENÁRIO: ENFERMARIA DE UM HOSPITAL.

AO ABRIR AS CORTINAS, VEMOS AO FUNDO DO PALCO, TRÊS CAMAS, UMA ESTÁ VAZIA E AS OUTRAS DUAS TÊM UM SENHOR EM CADA UMA. RESPIRAM COM AJUDA DE APARELHOS. UM SENHOR, USANDO UM PIJAMA, ENTRA EM CENA. CAMINHA COM A AJUDA DE UMA BENGALA E VAI ATÉ O PROSCÊNIO.

Juvenal         – Não sei o porquê minha filha não vem me visitar, nem meus netos, até aqueles meus amigos que diziam serem meus amigos, não apareceram um só dia para me visitar! Desde que me internaram aqui neste hospital, na vejo ninguém. Mas, deixa estar, quando eu sair daqui, vou acertar as contas com aqueles traidores. Eles vão ver só! (TEM UM CATETER NASAL. RESPIRA COM DIFICULDADE. CAMINHA PELO PROSCÊNIO) Eu já estou cansado de ficar aqui neste hospital, se ainda a comida fosse boa… A verdade que não vejo a hora de voltar para casa, poder passar as minhas noites dançando… Aliás, eu nem sei bem o porquê ainda estou aqui, estou me sentindo tão bem. (TENTA EXERCITAR OS BRAÇOS E TEM UM ACESSO DE TOSSE) Amanhã mesmo vou pedir para o médico me deixar ir para casa.

VAGAROSAMENTE O SENHOR SE DEITA NA CAMA VAZIA. OUVE-SE UM GRITO DE DOR. O APARELHO DE UMA DAS CAMAS COMEÇA APITAR SEM PARAR. BLACK OUT. SILÊNCIO. UMA DAS CAMAS ESTÁ VAZIA. LUZ GERAL. OUTRO SENHOR, USANDO PIJAMAS, ENTRA EM CENA, TAMBÉM COM A AJUDA DE UMA BENGALA E VAI ATÉ O PROSCÊNIO.

Maneco         – Já não me lembro mais quanto tempo que estou aqui neste hospital, aliás, na verdade, não sei bem porque cheguei aqui! O estranho é que minha mulher não veio me visitar nenhum dia. Ninguém veio me ver, nem meus filhos, nem meus netos, nem mesmo os meus amigos que sempre tiveram ao meu lado, vieram me fazer uma visita. (ELE TAMBÉM TEM UM CATETER NASAL. ANDA VAGAROSAMENTE. PARA) Quando foi que eu comecei a usar essa bengala? Pelo menos quando minha mulher me trouxe pro hospital e não precisava disso. (MEXE NAS PERNAS) Que dia eu comecei a usar isso aqui? (RESPIRA COM DIFICULDADE) E essa canseira que não passa! (PUXA O AR E NÃO CONSEGUE. TOSSE) Será que ainda vou ficar muito tempo neste hospital? Estou com tanta saudade da minha mulher, dos meus filhos, dos meus amigos! Se eu me lembro bem, o médico me disse que logo, logo eu voltaria pra casa. Esse logo, logo não chega nunca!

ELE CAMINHA ATÉ A CAMA VAZIA E SE DEITA. OUVE-SE UM GRITO DE DOR. O APARELHO DE UMA DAS CAMAS COMEÇA APITAR SEM PARAR. BLACK OUT. SILÊNCIO. LUZ GERAL. OUTRO SENHOR, TAMBÉM USANDO PIJAMAS E PORTANDO UMA BENGALA. ENTRA EM CENA E VAI ATÉ O PROSCÊNIO.

Zeca               – Meu Deus! Eu nunca me senti assim tão sozinho na minha vida, desde que entrei neste hospital não sei notícia de ninguém! Até os meus amigos de todo dia não vieram me ver. Não sei nem há quantos dias estou aqui dentro! Minhas ideias andam meio embaralhadas. Que dia será hoje? Será que é noite ou será que é dia? E essa sensação de não ter ar que não passa? (ELE TAMBÉM TEM UM CATETER NASAL. TENTA PUXAR O AR E NÃO CONSEGUE). Essa dor no peito… Ô, meu Deus, não quero morrer ainda não, viu? Tenho muita vida pra viver! Quando eu comecei usar essa bengala que não me lembro? Deve ser porque eu não aguento mais ficar de pé!

CAMINHA, VAGAROSAMENTE, COM A AJUDA DA BENGALA E SE DEITA NA CAMA VAZIA. OS APARELHOS VOLTAM A APITAR DESCONTROLADAMENTE, OUVEM-SE VOZES ENTRELAÇADAS. OS APARELHOS PARAM. SILÉNCIO. BLACK OUT. LUZ GERAL. UM SENHOR ENTRA EM CENA, TRAJANDO UM PIJAMA, TEM OS PÉS DESCALÇOS, SE APOIA EM UMA BENGALA. DO OUTRO LADO, ENTRA UM OUTRO SENHOR,  TAMBÉM TRAJANDO UM PIJAMA, TEM OS PÉS DE DESCALÇOS. CAMINHA VAGAROSAMENTE.

Juvenal         – Maneco!

Maneco         – Juvenal!

OS DOIS SE ABRAÇAM. ELES SE SEPARAM.

Juvenal         – Por onde tu andava, meu amigo?

Maneco         – Estive internado! Muito mal! E você?

Juvenal         – Eu também!

Maneco         – Foi o vírus também?

Juvenal         – E não foi? Fiquei um trapo!

Maneco         – E eu?

Juvenal         – O pior é o medo de não ver mais ninguém!

Maneco         – Nunca sentia tanta saudade da minha mulher, dos meus filhos, dos meus netos… Até de vocês eu senti saudade!

Juvenal         – Vocês também me fizeram muita falta!

OS DOIS SE ABRAÇAM NOVAMENTE. SE SEPARAM.

Juvenal         – Gosto muito de você, meu amigo!

Maneco         – Você sempre foi meu irmão!

Juvenal         – E a quanto tempo, hein?

Maneco         – Desde quando você namorava a minha mulher.

Juvenal         – Mas eu nunca tive chance. Vocês sempre foram apaixonados demais! Nunca teria chance. Preferi preservar a nossa amizade.

Maneco         – E você sempre foi um bom amigo!

Juvenal         – Só que pensei muitas vezes roubar ela te ti, viu?

Maneco         – Devia ter tentado! Aquela virou uma peste!

Juvenal         – Deixa de ser rabugento, Maneco!

Maneco         – É que você não conviveu toda uma vida com ela!

Juvenal         – Deixa de ser ingrato, Maneco!

Maneco         – Ingrato, eu?

Juvenal         – Ela sempre te amou. E você também sempre foi louco por ela! Agora fica aí reclamando! Queria ver se você não tivesse mais ela pra você encher o saco? Você ia ficar mais doente que sempre foi.

Maneco         – É que a Lourdes morreu cedo, senão você não estaria falando diferente de mim.

Juvenal         – Você é louco por ela! Queria eu que a Lourdes tivesse comigo até hoje.

Maneco         – Duvido! Mulher do nosso lado a vida toda parece castigo.

Juvenal         – De repente ela se deu conta disso e por isso não veio mais te ver.

Maneco         – Você acha?

Juvenal         – Ah, se a Lourdes tivesse viva!

Maneco         – Mas você também vivia reclamando dela!

Juvenal         – Implicância boba minha!

Maneco         – Vivia dizendo que era um inferno viver com ela.

Juvenal         – Tudo mentira! Na verdade eu fui muito feliz com a Lourdes, viu?

Maneco         – Não parecia! Do jeito que reclamava dela!

Juvenal         – Ela sempre foi meu par perfeito. Dançar com ela, era dançar sobre as nuvens. E olha que eu era bom nisso, hein! Agora minhas pernas não deixam mais, mas quando eu pegava na cintura dela, a gente deslizava pelos salões. Pena que ela já se foi! Senti tanta saudade dela nesses dias, que até sonhei que ela vinha me buscar.

Maneco         – Força, meu amigo! Nós estamos juntos!

Juvenal         – E você devia dar mais valor para Maria e deixar de ser um velho rabugento e reclamam.

Maneco         – Mas ela é uma ingrata! Sabe por que Juvenal? Ela não veio me visitar um só dia, e até agora ainda não veio me ver.

Juvenal         – Ela vai vir, Maneco! Agradece a Deus que ela está contigo!

Maneco         – Outro que também é um ingrato, é o Zeca!

Juvenal         – Você não ficou sabendo?

Maneco         – Não. O quê aconteceu? Não vai dizer que meu amigo…

Juvenal         – Ele foi internado um dia antes de mim, tava muito mal que foi direto para UTI, também estou muito preocupado com ele.

Maneco         – Eu não sabia! Eu já estava internado.

Juvenal         – Eu não tinha como te avisar!

Maneco         – Eu me lembro que fui internado. Não sei bem que dia. Foi tudo tão de repente.

Juvenal         – Eu ia visitar ele no dia seguinte, só que na madrugada minha filha me levou para o hospital e não vi mais ninguém.

ENTRA UM SENHOR, TRAJANDO UM PIJAMA, TAMBÉM TEM OS PÉS NO CHÃO. CAMINHA COM A AJUDA DE UMA BENGALA.

Zeca               – Quem quer jogar porrinha ai?

OS TRÊS APONTAM AS MÃOS FECHADAS

Juvenal         – Eu quero quatro!

Marreco         – Eu quero sete!

Zeca               – É três!

OS TRÊS ABREM AS MÃOS VAZIAS.

Zeca               – Deu lona!

OS TRÊS SE ABRAÇAM.

Zeca               – Estava com tanta saudade de vocês, meus amigos! Nunca me senti tão sozinho!

Maneco         – Olha quem diz que está com saudade! O velho babão que anda cheio de menininhas!

Juvenal         – Você não perde a oportunidade, hein, Maneco?

Zeca            – Aquelas meninas todas não são nada perto dos meus amigos! Depois que fiquei no hospital é que percebi como vocês me fazem falta.

Maneco         – Desculpa, Zeca! A gente também tava com saudade de você, amigo!

Juvenal         – Também está de bengala, Zeca?

Zeca               – Ganhei isso no hospital!

Juvenal         – Também ganhei a minha no hospital!

Zeca               – E cadê a sua, Maneco?

Maneco         – Joguei pela janela!

Zeca               – Esse é meu amigo, Maneco, rabugento como sempre!

TODOS RIEM.

Zeca               – Por onde vocês andavam que não foram me visitar um só dia!

Juvenal         – A gente estava internado também

Zeca               – Os dois?

Maneco         – Esse vírus nos derrubou!

Zeca               – Eu sabia que você tinha internado, mas quando eu ia te visitar, fiquei tão mal que acabei sendo internado no dia seguinte que a Maria.

Juvenal         – Que Maria?

Maneco         – Você está falando da minha Maria?

Zeca               – Não te contaram?

Maneco         – Contaram o quê?

Juvenal         – O quê aconteceu, Zeca?

Zeca               – A Maria estava internada também.

Maneco         – E cadê ela? Ninguém me falou nada.

Zeca               – Você estava internado muito mal. Depois eu me internei também muito mal.

Juvenal         – E a Maria?

Zeca               – Eu vi a Maria! Não sei. Será que não era ela? Ando muito confuso.

Maneco         – A Maria está aqui? Cadê? Maria! Me leva pra casa, Maria! Eu estou com saudade de brigar contigo! Maria, eu te amo, Maria!

MANECO ANDA COM DIFICULDADES PELA CENA. RESPIRA COMO QUEM BUSCA O AR. CAMINHA ATÉ SE DEITAR EM UMA DAS CAMAS VAZIAS. O APARELHO DA CAMA DE MANECO VOLTA A APITAR.

Juvenal         – Onde foi o Maneco?

Zeca               – Foi atrás da Maria! Eles se amam de verdade! E você que era louco por ela, hein? Essa você perdeu!

Juvenal         – É, meu amigo, essa eu perdi de lavada!

Zeca               – Mas você teve a Lourdes, e eu?

Juvenal         – E você, Zeca?

Zeca               – É Juvenal, e eu?

Juvenal         – Você aproveitou a vida, Zeca! Não tem do que reclamar! Sempre foi um bom vivant! Carros e garotas novas toda hora! E você vem me dizer: e eu? Queria eu ter levado a vida que você levou!

Zeca               – Mas agora estou aqui, abandonado em uma cama de hospital e ninguém veio me ver! Você não, você teve a Lourdes, teve filho, netos, formou uma família, você nunca vai estar sozinho!

Juvenal         – Então, mas eu também estou! Ou vou se acha que vieram me ver? Vieram nada! Filha e netos são todos ingratos, isso sim! A gente fica velho, ninguém mais quer saber da gente.

Zeca               – É claro que não me arrependo de tudo que fiz, foi a vida eu eu escolhi! Só que podia ter juntado meus trapinhos com alguém, pelo menos nessa hora, eu teria alguém para encontrar.

Juvenal         – Mas teus amigos estão aqui contigo! Me dá um abraço!

OS DOIS SE ABRAÇAM. ELES SE APARTAM.

Juvenal         – Se lembra do acordo que fizemos, lá no colégio?

Zeca               – Que acordo?         

Juvenal         – Amigos pra toda vida! E para depois dessa vida também!

Zeca               – E a gente combinou que quem morresse primeiro vim buscar o outro! Lembra disso?

Juvenal         – Claro! Isso já faz mais de sessenta anos, hein?

Zeca               – Será que o Maneco esqueceu?

Juvenal         – Quando ele voltar a gente pergunta pra ele.

Zeca               – Será que ele volta?

Juvenal         – Tenho certeza!

Zeca               – E se ele resolver ficar com a Maria?

Juvenal         – Ele ficou a vida toda com a Maria, mas sempre esteve ao nosso lado. Maneco é parceiro.

Zeca               – Ainda bem que encontrei vocês, estava me sentindo solitário neste hospital!

Juvenal         – Pra falar a verdade, eu também. Até porque a ingrata da minha filha e dos meus netos não deram as caras por aqui.

Zeca               – Mas, sabe, Juvenal, hoje eu queria ter alguém pra encontrar!

Juvenal         – Ih, não estou te reconhecendo, Zeca!

Zeca               – Nem eu, Juvenal! Parece que fiquei um velho melancólico!

Juvenal         – Deve ser da doença. Eu também estou me sentindo abandonado. Foi bom encontrar com vocês. Vocês são meus amigos! Meus irmãos!

ZECA ABRAÇA JUVENAL E COMEÇA A CHORAR.

Zeca               – Estou com medo de morrer sozinho!

Juvenal         – Que morrer nada! A gente não está aqui?

ZECA SE SOLTA DE JUVENAL.

Zeca               – Desculpa, Juvenal!

Juvenal         – Que isso, Zeca, não precisa se desculpar de nada. Nós somos amigos, ou não somos? Estamos juntos pra sempre, lembra?

Zeca               – É isso! Estamos juntos!

JUVENAL COMEÇA A TER DIFICULDADE PARA RESPIRAR. BUSCA O AR E NÃO CONSEGUE.

Juvenal         – Zeca!

Zeca               – Fala, Juvenal?

Juvenal         – Está ficando tudo escuro!

Zeca               – Respira!

Juvenal         – Não consigo.

Zeca               – Devagar!

Juvenal         – Preciso ir, Zeca! Não consigo respirar! A Lourdes! A Lourdes vem me ver! Eu sonhei com ela ontem! Preciso voltar!

Zeca               – Estou aqui contigo!

Juvenal         – Zeca! Zeca! Cadê você?

Zeca               – Estou aqui, meu amigo!

Juvenal         – Maneco! Maneco! Cadê você?

JUVENAL ANDA COM DIFICULDADES PELA CENA. RESPIRA COMO QUEM BUSCA O AR. CAMINHA ATÉ SE DEITAR EM UMA DAS CAMAS VAZIAS. O APARELHO DA CAMA DE JUVENAL VOLTA A APITAR.

Zeca               – Juvenal! Cadê você, Juvenal? Você disse que ia ficar comigo e sumiu! Fez igual o Maneco que foi atrás da Maria e não voltou até agora! Eu não quero ficar sozinho. Estou sentindo muito medo disso tudo! Nós fizemos um acordo, você falou dele. Eu, você e o Maneco! Amigos para sempre e até mais! Agora os dois me deixaram aqui sozinho neste hospital. Cadê vocês!

BLACK OUT.

LUZ GERAL. MANECO ENTRA POR UM LADO E ENCONTRA ZECA CAÍDO NO CHÃO.

Maneco         – O que aconteceu, Zeca? Zeca?

ZECA DESPERTA E É LEVANTADO COM A AJUDA DE MANECO.

Maneco         – Você está bem?

Zeca               – Eu estava aqui conversando com o Juvenal…

Maneco         – E pra onde foi o Juvenal?

Zeca               – Não lembro. Quem é você?

Maneco         – Como que sou eu? O Maneco!

Zeca               – Maneco! Que bom que você veio!

ZECA ABRAÇA MANECO COM TODA FORÇA.

Zeca               – Estava com saudades de você, meu amigo! Ainda bem que você não esqueceu do nosso acordo?

MANECO SE SOLTA DE ZECA.

Maneco         – Que acordo?

Zeca               – Que fizemos no colégio!

Maneco         – Aquela besteira de ser amigo pra sempre?

Zeca               – E quem morresse primeiro vinha buscar o outro?

Maneco         – Você passou a vida acreditando nessa besteira, Zeca?

Zeca               – Nossa amizade foi besteira!

Maneco         – Claro que não! Não somos amigos até hoje? Só não acredito naquela besteira que o Juvenal falou que quem morresse primeiro vinha buscar os outros. Isso sempre foi uma besteira.

Zeca               – E seu morri e estou aqui pra te levar?

Maneco         – Pare com essa besteira, Zeca.

Zeca               – E se eu sou um fantasma que veio buscar o Juvenal e ele fugiu? Agora você está aqui. Posso te levar comigo!

Maneco         – Você deve ter batido a cabeça quando caiu.

Zeca               – Mas não pode ser verdade?

Maneco         – Não! Por acaso você conhece alguém que abraça um fantasma?

Zeca               – Não!

Maneco         – Então você não é um fantasma!

Zeca               – Porque você tem tanta certeza?

Maneco         – A gente se abraçou, Zeca! E vamos mudar de conversa. Que história é essa que você disse que viu a Maria?

Zeca               – Eu vi a Maria!

Maneco         – Eu rodei esse hospital todinho e nem sinal da minha mulher! Que brincadeira mais sem graça, Zeca! Parece que ainda é aquele bom vivant de antigamente que gostava de passar trote em todo mundo!

Zeca               – Mas eu vi a Maria! Eu falei com a Maria! Só se ela não te achou e foi embora.

Maneco         – Eu duvido! Se a Maria tivesse vindo me ver, ela estaria aqui até agora.

Zeca               – Então eu não sei, Maneco!

Maneco         – E o Juvenal?

Zeca               – Ele sumiu!, A gente estava aqui conversando, de repente ele começou a passar mal e foi sumindo, sumindo… foi ficando tudo escuro. Não sei aonde foi o Juvenal! Só lembro de quando você me acordou.

Zeca               –  De repente a Maria encontrou ele.

Maneco         – Que conversa é essa agora, Zeca?

Zeca               – Todo mundo sabe que o Juvenal sempre foi louco pela Maria.

Maneco         – Mas ela me escolheu!

Zeca               – E se ela desistiu de você. Seu velho rabugento!

MANECO ACERTA UM SOCO EM ZECA.

Zeca               – Que violência, Maneco! Eu devia te dar uma bengalada!

Maneco         – Você nunca mais fale isso da minha mulher!

Zeca               – Você continua o mesmo esquentadinho de sempre!

Maneco         – E você que me conhece há sessenta anos devia saber disso. Você parece que não cresceu, velho!

MANECO SE COLOCA DE COSTAS PARA ZECA. ZECA SENTE UMA FORTE FALTA DE AR.

Zeca               – Maneco!

Maneco         – Oras, não me enche, Zeca!

Zeca               – Eu preciso de sua ajuda!

MANECO SAI DE CENA.

Zeca               – Eu não estou conseguindo respirar! Socorro, meu amigo! Me ajuda! Maneco, me ajuda! Maneco! Maneco!

ZECA ANDA COM DIFICULDADES PELA CENA. RESPIRA COMO QUEM BUSCA O AR. CAMINHA ATÉ SE DEITAR EM UMA DAS CAMAS VAZIAS. O APARELHO DA CAMA DE ZECA VOLTA A APITAR. OS TRÊS ESTÃO NA CAMA. OS APARELHOS COMEÇAM A AUMENTAR A FRENQUÊNCIA DE APITOS. BLACK OUT. LUZ GERAL. MANECO ESTÁ EM UM DOS CANTOS, NO PROSCÊNIO, VESTE UM TERNO. ESTÁ DESCALÇO. FOCO EM MANECO.

Maneco         – Maria, onde você está Maria que não vem me visitar? Eu sei que fiquei um velho ranzinza e rabugento e que passava os dias a implicar contigo, mas é meu jeito, você me conhece há mais de cinquenta anos! Você sabe que eu te amo de verdade. Eu estou sentindo a tua falta! É muito triste toda essa solidão aqui! (TENTA BUSCAR O AR. RESPIRA COM DIFICULDADES) Na verdade, não é só a solidão, estou com medo da morte. Morrer sem te ver e não poder te ver mais, acho que não vou suportar! Com quem vou implicar por mexer nas minhas coisas? Com quem vou reclamar da comida fria? Com quem vou reclamar por esconder os meus remédios? Com quem vou reclamar por ficar pegando no meu pé? Pra quem vou pedir perdão por tudo isso? Pra quem vou dizer que amei a vida inteira e nunca disse? (TENTA BUSCAR O AR. RESPIRA COM DIFICULDADES) Eu te amo, Maria, vem me tirar daqui! Eu te imploro! Também estou com medo de morrer e não ver meus amigos Juvenal e Zeca, eles sempre foram os meus irmãos de verdade, eles se acostumaram com o meu jeito rabugento, minha mania de tomar remédios, com meu jeito de ser amigo deles. Eles foram grandes companheiros e conselheiros na minha vida. Eles vieram me ver, mas soube também que eles estão internados como eu e não vão poder vir aqui a toda hora. Juvenal sempre foi o melhor amigo, não esperava que ele continuasse sendo meu amigo depois que você me escolheu Maria. Nunca tocou uma só vez nesse assunto. Que saudade, meu amigo Juvenal! (TENTA BUSCAR O AR. RESPIRA COM DIFICULDADE) O Zeca, você conheceu o Zeca, sempre foi de levar a vida mais leve. Ele sabe viver a vida, aquele velhaco! Eu queria aproveitar a vida como ele, mas nunca tive a coragem de viver na corda bamba que ele sempre viveu. E o Zeca é alegre, divertido, sempre gosta de fazer piada com tudo! Ê, meu amigo, Zeca, de quantas coisas você fez a gente rir, não é mesmo? Que saudade, meu amigo Zeca!

FECHA O FOCO EM MANECO. ABRE O FOCO NO CENTRO DO PROSCÊNIO. ONDE SE ENCONTRA JUVENAL VESTIDO COM UM CONJUNTO DE AGASALHO ESPORTIVO, TAMBÉM ESTÁ DESCALÇO.

Juvenal         – Sabe, Lourdes, sinto muito a tua falta, nossa filha tem cuidado bem de mim, mas é diferente. Você foi uma companheirona, sabia? Eu nunca te confessei, mas acho que você sempre soube, meu único amor foi a Maria, mas ela escolheu meu amigo Maneco, não podia passar a minha vida com alguém que não gostasse de mim. E você me amava, disso eu tenho certeza! (TENTA BUSCAR O AR. RESPIRA COM DIFICULDADES) E eu aprendi a gostar muito de você! Olha que acho que foi quase amor! Mas a gente foi feliz, não foi? Nunca tivemos uma briga sequer! Sofri tanto quando aquela doença maldita te levou! Sofro até hoje! Não foi justo contigo. Você sempre foi um boa esposa, uma boa mãe, cuidou da nossa família como ninguém mais cuidaria! Ai como eu queria te encontrar de novo! (TENTA BUSCAR O AR. RESPIRA COM DIFICULDADES) E, os meus amigos Maneco e Juvenal, hein? Você sempre foi gentil com eles, mesmo com o Maneco, apesar de tudo! E eles são meus amigos até hoje, sabia? Eles vieram me ver, mas soube que eles também estão internados como eu. Tomara que eles saiam dessa! Maneco, aquele velho ranzinza e rabugento, porque, Lourdes, ele ficou insuportável, sabia? Sempre foi um grande amigo! Mesmo quando a Maria escolheu ele, eu não quis deixar de ser amigo dele. Devia ter dado um soco naquela cara, mas ele não tinha culpa, o amor é quem escolhe, e o amor escolheu ele. Sempre foi um irmão, cuidou de tudo  quando você teve que partir. Tenho medo de morrer e não ver mais o Maneco! Devo muito a ele! (TENTA BUSCAR O AR. RESPIRA COM DIFICULDADE) E o Zeca, esse sempre foi o ponto de equilibro da nossa amizade. Tinha sempre uma história engraçada pra contar sobre as inúmeras namoradas que ele teve na vida! Sempre esteve do nosso lado, toda vida! Ele levava aquela vida sem compromissos e estava certo, o Zeca não esquentava com nada, deixava o barco correr e sempre estava do nosso lado quando a gente não sabia o que fazer com a vida. Estou sentindo muita saudade do meu amigo Zeca!

FECHA O FOCO EM JUVENAL. ABRE O FOCO NO OUTRO CANTO DO PROSCÊNIO ONDE ESTÁ O ZECA QUE VESTE UMA CALÇA DE TERGAL E UMA CAMISA DE SEDA DE MANGAS LONGOS. ESTÁ DESCALÇO.

Zeca               – É, parece que estou chegando no fim da vida! Mas não tenho que reclamar de nada, eu vive a vida que eu pude viver. Eu fui feliz! Curti cada momento da minha vida. E uma coisa eu posso falar com sabedoria: Eu nunca esquentei com nada e essa foi a minha melhor escolha. Eu sempre estive comigo e nunca deixei que ninguém me dissesse o que eu tinha que fazer, eu levei minha vida como sempre quis, mas só me arrependo de uma coisa, nunca ter encontrado o amor. Vive só de aventuras e hoje a solidão me assusta como nunca me assustou! (TENTA BUSCAR O AR. RESPIRA COM DIFICULDADE) Ainda bem que nessa vida encontrei dos amigos! Não, encontrei dois irmãos! Maneco e Juvenal sempre foram a minha família! Quando estava com eles a solidão não me assustava, e conseguimos ficar amigos até hoje. Mais de sessenta anos de amizade! O Maneco, um trabalhador responsável, um pai de família, um chato, às vezes até chato demais quando falava que eu tinha que parar de levar a vida sem responsabilidade. Era estressado como ele só, por isso que virou um velho rabugento e hipocondríaco! Mas era nele que eu pensava quando ia fazer alguma burrada na vida. Maneco é um irmão mais velho! Ele veio me ver, mas soube que também não está nada bem! Maneco, meu irmão, que saudade! (TENTA BUSCAR O AR. RESPIRA COM DICIFULDADE) Já o Juvenal tem minha admiração! Soube superar a escolhe da Maria pelo Maneco e continuou firme com a amizade. Juvenal, sempre foi mais descontraído que o Maneco. Foi um bom marido para Lourdes, que gostava dela, mais do que gostava dela. Juvenal, sempre foi um pé de valsa e encontrou na Lourdes seu par perfeito acho que por isso que eles foram felizes. Juvenal sempre estava comigo quando era para irritar o Maneco. Ele veio me visitar outro dia, mas soube que ele está doente. Tenho saudade, de você, Juvenal!

LUZ GERAL. OS TRÊS SE OLHAM.

Maneco         – Juvenal!

Juvenal         – Zeca!

Zeca               – Maneco!

Maneco         – Vocês também saíram do hospital?

Juvenal         – Eu acho que a gente morreu!

Maneco         – Para com essa conversa mole, Juvenal!

Zeca               – Será, Juvenal!

Juvenal         – Eu acho! Não estamos mais de camisola do hospital.

Maneco         – Isso só mostra que já estamos fora daquele hospital!

Zeca               – Cadê nossas bengalas?

Juvenal         – Pra quê a gente ia precisar de bengala se a gente ta morto?

Maneco         – Eu não to morto!

Zeca               – Eu não conheço este lugar!

Juvenal         – Eu também não!

MANECO ANDA PELA CENA. JÁ NÃO TEM MAIS DIFICULDADE DE ANDAR.

Zeca               – Olha o silêncio deste lugar!

Juvenal         – (RESPIRA FUNDO) Olha, já possa até respirar!

Maneco         – Vocês deve estar malucos! Maria nem veio me buscar!

Juvenal         – Nós cumprimos a nossa promessa!

Zeca               – Morremos, mas estamos juntos!

Maneco         – Eu não acredito! Eu não morri!

Juvenal         – Amigas para além da vida, lembram?

JUVENAL ESTENDE, ZECA TAMBÉM ESTENDE A SUA.

Zeca               – Vamos, Maneco, estende a tua também!

Os Três          – Amigos pra toda a vida e além!        

OS TRÊS SAEM DE CENAS, ABRAÇADOS. MANECO SAI RESMUNGANDO QUE NÃO ESTÁ MORTO.

FOCO NAS TRÊS CAMAS VAZIAS E ARRUMADAS.

A LUZ VAI CAINDO EM RESISTÊNCIA. FECHAM-SE AS CORTINAS.

– FIM –


Quanto custa a Liberdade?

setembro 24, 2021

CENÁRIO: RUA DE UMA CIDADE

EM CENA, SENTADO NO CENTRO DO PALCO, UM HOMEM CEGO, PEDE ESMOLA ENQUANTO CANTA COM SEU VIOLÃO.

Homem          – Quanto custa a liberdade                      

                          Para quem está preso

                          Nas garras do amor?                     

UM CASAL ENTRA EM CENA DISCUTINDO.

Mulher           – Eu não aguento mais você!

Homem1       – Mas saiba que eu também não agüento mais você!

Homem          – Uma esmolinha pelo amor de Deus! Ajude esse pobre homem que está preso na escuridão!

O HOMEM1 JOGA UMAS MOEDAS NA CAIXINHA DO HOMEM.

Homem          – Deus lhe pague!

Mulher           – Eu preciso de liberdade!

Homem1       – E você não tem liberdade?

Mulher           – Não!

Homem1       – E quem lhe prende?

Mulher           – Você!

Homem1       – Desde quando?

Mulher           – Desde sempre!

Homem1       – Mas nunca prendi você!

Mulher           – Eu nunca tive liberdade!

Homem1       – Você não me ama mais?

Mulher           – Não estou falando de amor, estou falando de liberdade!

Homem1       – Amor e liberdade são um casal.

Mulher           – Nós não somos mais um casal!

Homem1       – É, você não me ama mais, acho que o nosso amor chegou ao fim.

Mulher           – Eu já disse que não estou falando de amor! Eu só quero um pouco de liberdade!

Homem1       – Se o nosso amor hoje te prende, ele não existe mais. Nunca te tirei a liberdade, você que se prendeu a mim pelo amor. Nós somos livres, mesmo presos ao nosso amor, ele tira a nossa liberdade. Achei que a gente fosse livre, ainda que juntos. Você tem alguém?

Mulher           – Eu não tenho ninguém! Eu te amo, droga! Eu só quero um pouco de liberdade! Este amor… Eu já decidi!

Homem1       – Você sempre teve liberdade! Quem te prendia era o amor e era por ele que você pensava não ter liberdade, mas você sempre teve. Eu sempre me senti livre, porque te amar sempre me deu liberdade, eu não estou preso a você, eu amo você e isso não me prende. Se o nosso amor está te prendendo, é porque o amor acabou.

A MULHER ABRAÇA O HOMEM1.

Mulher           – Eu te amo! Eu amo te amar!

Homem1       – Eu também te amo!

OS DOIS SE SEPARAM.

Mulher           – O amor não acabou, mas eu vou… Preciso ir, até para saber se minha liberdade está no amor que eu sinto por você! Eu te amo!

Homem1       – Espero que você não demore!

A MULHER SAI DE CENA POR UM LADO E O HOMEM PELO OUTRO.

Homem          – Quanto custa a liberdade

                          Para quem não sai ileso

                          Do veneno do rancor?

ENTRAM EM CENA UM HOMEM E UMA MULHER.

Homem          – Uma esmolinha pelo amor de Deus! Ajude esse homem que está preso dentro da escuridão!

Homem2       – Você é uma vagabunda!

Mulher1         – Você não é meu dono!

Homem2       – Se a gente ta junto, não tem que ficar se esfregando com um viado!

Mulher1         – A gente ta junto, mas eu sou livre, e meu amigo não é viado!

Homem2       – É um viadinho sim! Tava lá rebolando contigo.

Mulher1         – Eu não sei o quê eu vi em você! Você é nojento!

O HOMEM2 DÁ UM TAPA NA MULHER1

Homem2       – Olha como fala comigo, sua vagabunda! Agora vamos pra casa que a brincadeira acabou!

A MULHER TIRA DA BOLSA UM ESTILETE.

Mulher1         – Eu não quero mais nada com você!

O HOMEM2 VAI PRA CIMA DA MULHER1.

Mulher1         – Não encosta em mim!

O HOMEM2 TENTA AGARRAR A MULHER, QUE RISCA O ESTILETE EM SEU BRAÇO.

Homem2       – Você me cortou!

Mulher1         – Isso é só um aviso! Agora vai lá e pede pra tua amante cuidar do teu braço. Seu corno!

A MULHER1 SAI DE CENA. O HOMEM2 SAI ATRÁS DELA.

Homem          – Quanto custa a liberdade

                          Para quem tem coragem

                          De falar o que verdadeiramente pensa?

ENTRA UMA MULHER SEGURANDO UM CARTAZ DE PROTESTO.

Mulher2         – Eu quero liberdade!.. Eu quero liberdade!… Abaixo a esse bando de covardes!… Fora com esses juízes canalhas! Fora com esses políticos ladrões!… Eu quero liberdade!

ENTRA UM POLICIAL.

Policial          – Minha senhora, a senhora não pode fazer esse protesto aqui!

Mulher2         – Por quê? Agora é proibido falar o que a gente pensa?

Policial          – Minha senhora, o juiz determinou que não se pode atentar contra a democracia.

Mulher2         – Quem está atentando contra a democracia, eu? Ou esse juiz que não me deixa falar o quê penso?

Policial          – Minha senhora!…

Mulher2         – Eu quero liberdade!.. Eu quero liberdade!… Abaixo a esse bando de covardes!… Fora com esses juízes canalhas! Fora com esses políticos ladrões!… Eu quero liberdade!

Policial          – Minha senhora, se a senhora continuar com isso, vou ser obrigado a lhe levar presa.

Mulher2         – Qual é o meu crime? Falar o que eu penso?

Policial          – Bom, a senhora não me deixou escolha: A senhora está presa! Estique suas mãos!

O POLICIAL COLOCA ALGEMAS NA MULHER2.

Mulher2         – Isso é uma arbitrariedade! Isso sim é contra a Democracia!

Policial          – Ordem do juiz não se contesta, se cumpre!

Mulher2         – Eu quero liberdade!.. Eu quero liberdade!… Abaixo a esse bando de covardes!… Fora com esses juízes canalhas! Fora com esses políticos ladrões!… Eu quero liberdade!

OS DOIS SAEM DE CENA.

Homem          – Quanto custa a liberdade

                          Para quem se faz de covarde

                          E sabe bem que o crime compensa?

ENTRAM EM CENA UM HOMEM E UMA MULHER.

Homem          – Uma esmolinha pelo amor de Deus! Ajude esse pobre homem que vive preso na escuridão!

A MULHER COLOCA UMA MOEDA NA CAIXINHA DO HOMEM,

Homem3       – Você já fez a transferência do dinheiro para o Deputado?

Mulher3         – Tudo como combinado!

Homem3       – E as passagens já estão compradas?

Mulher3         – Passagem só de ida para Ilhas Caymam como o você pediu!

Homem3       – Perfeito!

Mulher3         – Mas se a polícia aparecer no escritório?

Homem3       – Fique tranqüila!

Mulher3         – Eu não quero complicação para o meu lado!

Homem3       – Não se preocupe! A Justiça joga no nosso time! Assim que me estabelecer, eu mando buscar você, benzinho!

O HOMEM3 DÁ UMA BITOCA NA MULHER3.

Homem3       – Aí, nós vamos viver uma vida de luxo no nosso paraíso!

Mulher3         – Você é meu herói!

A MULHER3 DÁ UMA BITOCA NO HOMEM3.

Homem3       – Agora é melhor eu partir, a justiça é do nosso time, mas a polícia, às vezes, não!

Mulhe3          – Então, vamos! Vou te levar ao aeroporto! Em breve estarei chegando por lá pra gente morrer de amor!

OS DOIS SAEM DE CENA.

Homem          – Quanto custa a liberdade

                          Custa o preço que você quiser

                          Às vezes custa uma vida inteira

                          Às vezes custa uma desilusão

                          Às vezes custa uma brincadeira

                          Às vezes custa dias de prisão

                          Mas, ser livre, é tudo o que se quer!

                          Só precisa estar disposto a pagar!

O HOMEM RECOLHE SUAS COISAS, SE LEVANTA E SAI DE CENA TATEANDO O CHÃO COM SUA BENGALA.

APAGUAM-SE AS LUZES. FECHAM SE AS CORTINAS.

– FIM –



ACERTO DE CONTAS

agosto 14, 2020

PERSONAGENS

Evaristo

Lurdinha

Dr.Alfredo

CENÁRIO: UM ESCRITÓRIO

AO ABRIR AS CORTINAS, VEREMOS EM UM CANTO DO PALCO UMA MESA COM UMA CADEIRA ALTA E DUAS A FRENTE DA MESA. NO OUTRO CANTO, UMA PEQUENA MESA COM UMA CADEIRA E NO CENTRO UMA OUTRA MESA COM OUTRA CADEIRA. ENTRA UM HOMEM E SE DIRIGE PARA A MESA PEQUENA NO CANTO DO PALCO.

Evaristo         – Preciso terminar esse relatório antes do Dr,Alfredo chegar, senão ele vai comer o meu fígado.

UM HOMEM ENGRAVATADO ENTRA E SE DIRIGE À OUTRA MESA.

Dr.Alfredo     – (GRITANDO) Evaristo! Cadê o relatório que eu te pedi?

ENTRA EM CENA, UMA MULHER COM ROUPAS SENSUAIS, PASSA PELA CENA COMO ESTIVESSE DESFILANDO E SE SENTA EM UMA DAS CADEIRAS EM FRENTE A MESA DO DR.ALFREDO.

Lurdinha       – Puxa, Fefe, te esperei a noite toda! E nem para atender as minhas mensagens…

Dr.Alfredo     – Dona Lourdes, agora estou ocupado, a senhora queira se dirigir à sua mesa e começar a trabalhar?

Lurdinha       – Ai, Fefe, não fala assim comigo!

Dr.Alfredo     – Dr. Alfredo! Dr. Alfredo! E faça uma ligação para o Banco que eu preciso falar urgente com o meu gerente. (GRITANDO) Evaristo, cadê o relatório?

EVARISTO CHEGA E ENTREGA O RELATÓRIO. LURDINHA VAI PARA SUA MESA DO CENTRO DO PALCO E FAZ A LIGAÇÃO.

Evaristo         – (ENTREGANDO O RELATÓRIO) Pronto, Dr.Alfredo, está aqui!

Dr.Alfredo     – (OLHANDO O RELATÓRIO) E então, qual é a nossa situação?

Evaristo         – A situação é que o senhor vai ter que demitir alguém.

Dr. Alfredo    – Eu sabia!

EVARISTO ENTREGA UM PAPEL PARA O DR. ALFREDO.

Dr. Alfredo    – O que é isso, Evaristo?

Evaristo         – Minha carta de demissão. Estou lhe poupando de ter que me mandar embora, pois como sou só eu e a Lurdinha, é claro que o senhor vai me mandar embora.

Dr.Alfredo     – (RASGANDO O PAPEL) De onde você tirou essa ideia?

Evaristo         – É que o senhor e a Lurdinha…

Dr.Alfredo     – O que é que tem eu e a Lurdinha?

Evaristo         – Vocês, são…

Dr.Alfredo     – São o quê?

Evaristo         – Deixa pra lá, Dr.Alfredo, afinal isso não é da minha conta. Vou arrumar as minhas coisas.

Dr.Alfredo     – Nada disso, você fica! Aonde eu vou encontrar um funcionário igual a você? Com quem eu posso contar para descobrir quem me passou uma rasteira? Você não sai até descobrir quem me passou a perna. Pode ir! (GRITANDO) Dona Lourdes, vem até a minha sala, agora!

EVARISTO SAI E CRUZA COM LURDINHA NO MEIO DO CAMINHO.

Evaristo         – Você não vai gostar do que ele tem pra te falar.

Lurdinha       – Você devia se preocupar com sua vida!

EVARISTO SENTA EM SUA MESA E COMEÇA A TRABALHAR. LURDINHA SENTA EM FRENTE À MESA DE DR. ALFREDO.

Lurdinha       – Resolveu me pedir desculpa, né Fefe?

Dr.Alfredo     – A senhora está despedida, Dona Lourdes, queira passar na mesa do Evaristo para assinar os seus papéis. Ele vai cuidar de tudo.

Lurdinha       – Como assim? E nós? Você não pode me tirar assim da sua vida! Ontem você não foi me ver, hoje você me manda embora. Isso não é assim, não, Alfredo!

Dr.Alfredo     – Eu não tenho mais nada que falar com a senhora. A senhora queira se retirar, por favor!

Lurdinha       – Você não pode me descartar da sua vida desse jeito! E o amor que você disse que sentia por mim? Você disse que ia se separar. Eu acreditei em você! Você é um crápula!

Dr.Alfredo     – Foi bom enquanto durou!

Lurdinha       – Eu vou acabar com você, Alfredo!

Dr.Alfredo     – Eu já estou acabado, dona Lourdes! Minha mulher me deixou, minha empresa quebrou, não tenho mais dinheiro, não posso ter mais uma amante. A senhora precisa entender.

Lourdinha     – Eu sei que isso tudo é mentira. Eu conheço muito bem os seus negócios!

Dr.Alfredo     – Outros tempos, outros tempos! Agora a senhora me dá licença que tenho uns assuntos para resolver, já que a senhora não fez a ligação para o banco que lhe pedi.

DR ALFREDO PEGA O TELEFONE. LURDINHA SAI FURIOSA E SENTA EM SUA MESA. EVARISTO SE APROXIMA, LHE TRAZ UM PAPEL.

Evaristo         – Luridinha, você pode assinar aqui, por favor?

LURDINHA PEGA O PAPEL DA MÃO DE EVARISTO, RASGA E JOGA NA CARA DELE.

Lurdinha       – Você não tem vergonha de ser capacho daquele crápula?

Evaristo         – É o meu trabalho, dona Lourdes!

Lurdinha       – Mascarar as transações do Alfredo é o seu trabalho?

Evaristo         – Eu não sei do que a senhora está falando.

Lurdinha       – Será que seu eu contar o que eu sei para o polícia, o senhor vai saber do quê estou falando?

Evaristo         – Fala baixo, Lurdinha, as paredes têm ouvido!

Lurdinha       – Eu sei de tudo!

Evaristo         – De tudo o quê?

Lurdinha       – De como você se finge de santo e de honesto.

Evaristo         – Eu não me finjo de nada.

Lurdinha       – Acho que antes de falar para polícia, vou falar para o Alfredo. Acho que ele vai gostar de saber quem você é de verdade.

Evaristo         – Deixa eu trabalhar que eu tenho mais o que fazer.

EVARISTO VAI ATÉ A SUA MESA. LURDINHA VAI PARA A SUA. DR.ALFREDO PASSA PELA MESA DE LURDINHA E NÃO OLHA. PARA NA MESA. PARA NA MESA DE EVARISTO.

Dr.Alfredo     – Evaristo, cuide de tudo por aí! Mas tarde eu volto. E não fique devendo nenhum centavo a Dona Lourdes, ouviu?

Lurdinha       -Pode deixar, Alfredo, não saio daqui sem todo o dinheiro que mereço!

DR.ALFREDO SAI. LURDINHA SE LEVANTA E VAI ATÉ A MESA DE EVARISTO E COLOCA UNS PAPÉIS SOBRE ELA.

Lurdinha       – Vamos acertar as minhas contas, Evaristo?

Evaristo         – (OLHANDO OS PAPÉIS) Como você conseguiu isso?

Lurdinha       – E sei que tem muito mais.

Evaristo         – O Dr.Alfredo não pode saber disso, senão ele me mata.

Lurdinha       – Quero metade disso para não falar para a polícia e a outra metade para eu não contar para o Alfredo.

Evaristo         – Você ta maluca!

Lurdinha       – É pegar ou largar!

Evaristo         – Você não ouviu falar que o Dr. Alfredo está quebrado?

Lurdinha       – Ele pode estar, mas você?

Evaristo         – Tenho uma proposta para você!

Lurdinha       – Que proposta?

Evaristo         – Faço de você minha amante, que nem o Alfredo. Vou te dar uma vida de rainha! Colocou um dos apartamentos no teu nome e te dou uma mesada. Que tal?

Lurdinha       – Você acha mesmo que eu vou aceitar isso?

Evaristo         – Se eu der tudo, o Alfredo vai desconfiar que foi você.

Lurdinha       – Então você vai gravar um depoimento para mim.

Evaristo         – Que depoimento?

Lurdinha       – Você vai falar tudo sobre os negócios sujos dele e como fez para encobrir tudo.

LURDINHA PEGA O CELULAR PARA GRAVAR.

Evaristo         – Não posso fazer isso!

Lurdinha       – Ou você prever falar tudo para polícia.

Evaristo         – Claro que não! O que minha família vai pensar de mim? Minha mulher, meus filhos? Nem pensar.

Lurdinha       – Então vamos lá, Evaristo. Pode começar.

LURDINHA APERTA O GRAVADOR DO CELULAR.

Evaristo         – Dr.Alfredo tem negócios com políticos que pagavam para que ele emitisse Notas Fiscais frias de serviços que não existiam e para não dar problemas para dele, eu abri uma outra empresa no nome dele para administrar o dinheiro, só que eu tinha uma procuração e movimentava o dinheiro dessa conta e aos poucos fui comprando imóveis… Mas eu sempre deixa um bom dinheiro na conta dele para ele não desconfiar.

Lurdinha       – Entendi!

LURDINHA TERMINA A GRAVAÇÃO.

Evaristo         – Só que alguém clonou o cartão dele e raspou todo dinheiro da conta dele!

Lurdinha       – Quem será, né Evaristo?

Evaristo         – Eu não tenho nada a ver com isso!

LURDINHA PELA UMA FOLHA EM BRANCO E DÁ PARA EVARISTO.

Lurdinha       – Agora escreve aí: – Eu, Evaristo de tanramtatam, nomeio minha procuradora Lourdes Maria com plenos poderes para movimentar minhas contas e vender meus imóveis… por tempo indeterminado.

Evaristo         – Não posso fazer isso!

Lurdinha       – A parte do Fefe eu já peguei, agora com a sua, as minhas contas estão quites!

Evaristo         – Então foi você?

Lurdinha       – Anda que eu tenho mais o quê fazer.

Evaristo         – Dr.Alfredo vai saber disso.

Lurdinha       – Ou isso ou a polícia.

EVARISTO ASSINA O PAPEL. ENTRA O DR ALFREDO.

Dr.Alfredo     – O que tem a polícia? Você ainda está aqui?

Lurdinha       – Estou terminando de acertar minhas contas, afinal, tanto tempo de amante do Dr.Alfredo, eu não podia sair de mãos abanando, não é verdade, Evaristo?

EVARISTO ENTREGA O PAPEL ASSINADO PARA LURDINHA. QUE LÊ E SAI DE CENA, GARGALHANDO.

Dr.Alfredo     – Porque ele está tão feliz?

Evaristo         – Foi ela que desviou todo o seu dinheiro!

Dr.Alfredo     – (GRITANDO) Lurdinha, volta aqui!

DR.ALFREDO SAI DE CENA ATRÁS DE LURDINHA. EVARISTO VAI ATÉ A SUA MESA, ABRE SUA GAVETA E PEGA UM PUNHADO DE DINHEIRO.

Evaristo         – É, pelo menos deu pra salvar algum pra recomeçar a vida longe daqui, porque se a Lurdinha mostrar a gravação para o Dr. Alfredo, ele faz picadinho de mim.

EVARISTO SAI DE CENA.

APAGAM-SE AS LUZ. FECHAM-SE AS CORTINAS.

– FIM –


O Príncipe Encantado

abril 24, 2020

CENÁRIO: UM REINO QUALQUER

NO CENTRO DO PALCO, UM GRANDE CALDEIRÃO, ATRÁS DELE, UM MAGO, QUE O MEXE COM UMA ENORME COLHER. ENTRA EM CENA UMA PRINCESA CORRENDO.

Princesa        – Mago! Mago! Preciso de seu ajuda!

Mago              – Psiu! Não grite! Assim você vai quebrar a energia positiva do caldeirão.

O MAGO CONTINUA A MEXER O CALDEIRÃO.

Princesa        – Desculpe, Mago! É que preciso muito da sua ajuda!

Mago              – Calma, Princesa! Sossegue essa aflição!

Princesa        – É que meu pai…

O MAGO PEGA UMA CANECA E UMA CONCHA, PENDURADAS NO CALDEIRÃO.

Mago              – O quê seu pai quer que você faça de tão grave para você ficar tão aflita.

O MAGO LEVA A CONCHA AO CALDEIRÃO, TRAZ UM POUCO DO LÍQUIDO E COLOCA DENTRO DA CANECA. CHEIRA

Princesa        – Ele quer que eu case!

Mago              – E o quem tem de mais nisso? Toda Princesa tem que casar um dia,

O MAGO EXAMINA O LÍQUIDO NA CANECA E O DEVOLVE PARA DENTRO DO CALDEIRÃO.

Princesa        – Mas eu não quero! Não com quem meu pai quer que eu case!

O MAGO ANDA PELA CENA COMO QUEM PROCURA ALGUMA COISA.

Mago              – E o que você quer que eu faça?

O MAGO PEGA UM FIO DE CABELO DA PRINCESA QUE SE ENCONTRA NA ROUPA DELA E O JOGA DENTRO DO CALDEIRÃO. VOLTA A MEXÊ-LO.

Princesa        – Que ajude a convencer o meu pai!

Mago              – Convencer seu pai de quê?

Princesa        – (GRITANDO) Que eu não quero casar!

Mago              – Psiu!

Princesa        – Desculpa, Mago! Mas por favor, me ajude!

O MAGO PEGA DE NOVO A CONCHA E A CANECA, PENDURADAS NO CALDEIRÃO, PEGA UM POUCO DO LÍQUIDO E O COLOCA NA CANECA,

Mago              – (CHEIRANDO) Pronto! Agora é só deixar descansando um pouco para que tudo entre em harmonia e a fórmula dê certo!.

O MAGO COLOCA O LÍQUIDO DA CANECA DENTRO DE UMA PEQUENA GARRAFA. PENDURA A CANECA NO CALDEIRÃO. VAI ATÉ O FUNDO DO PALCO E GUARDA A GARRAFINHA NO BOLSO DE SEU CASACO PENDURADO EM UM MANCEBO.

Mago              – Mas eu acho que você deveria casar!

A PRINCESA COLOCA O DEDO DENTRO DO CALDEIRÃO E LAMBE.

Princesa        – Eu não quero saber nesse negócio de amor. O senhor vai me ajuda, não vai?

O MAGO PEGA A PRINCESA PELO BRAÇO E OS DOIS ANDAM EM VOLTA DO CALDEIRÃO.

Mago              – Você já conhece o rapaz?

Princesa        – Não! E nem quero conhecer.

Mago              – Ninguém pode gostar ou desgostar de quem não conhece.

Princesa        – Mas eu já desgosto e não quero nem gostar!

Mago              – E se você se apaixonar a primeira vista!

Princesa        – (FAZENDO O SINAL DA CRUZ) Deus me livre! Quero me apaixonar, não, Mago! Quero ser livre! Não preciso de nenhum príncipe para ser feliz! E também não acredito nessa coisa de amor.

Mago              – Mas o Reino vai precisar!

Princesa        – Eu que vou reinar, não preciso de um príncipe pra isso.

Mago              – E se você amar o pretendente, você não casa?.

Princesa        – (GRITANDO) Eu não quero me casar!

SAI DE CENA. O MAGO PEGA O SEU CASACO E SAI ATRÁS.

Mago              – Não, Princesa! Espera, Princesa, espera!

O MAGO SAI DE CENA. ENTRA UM GAROTO, ÓCULOS, CABELOS COM GEL, CALÇA JEANS E UMA CAMISETA REGATA, TRAZ UM VIOLÃO PENDURADO NAS COSTAS. PARA NO CENTRO DO PALCO. TIRA O CELULAR DO BOLSO.

Garoto            – Pelo meu aplicativo, acho que aqui é o lugar! Vou descansar um pouco, pois to quebrado de tanta carona que peguei pra chegar nesse fim de mundo. Ê lugar perdido no mapa, viu? Vida de artista não é fácil! Bom, deixa eu relaxar um pouco, depois vou procurar o tal Rei que me contratou para cantar no casamento da Princesa dele.

ELE SE SENTA EM UMA PEDRA, PEGA O VIOLÃO E COMEÇA A DEDILHAR UMA CANÇÃO. ENTRA A PRINCESA ENFURECIDA.

Princesa        – Se papai insistir nessa história de casamento, eu sumo!

Garoto            – Que foi, princesa, ta estressada com quê?

Princesa        – Não é da sua conta!

Garoto            – Opa! Foi mal! Desculpa aí!

ELE VOLTA A DEDILHAR O VIOLÃO. ENTRA O MAGO.

Mago              – Espere, Princesa, vamos conversar!

Princesa        – Se o senhor não pode me ajudar, eu mesmo vou conversar com o meu pai. E se ele insistir com essa conversa de casamento, eu fujo pra sempre!

Mago              – Mas se você se apaixonar?

Princesa        – Eu não vou me apaixonar! Nunca!

O GAROTO COMEÇA A CANTAR UMA CANÇÃO ROMÂNTICA. A PRINCESA FICA ESTÁTICA OLHANDO O GAROTO

Mago              – Pronto, já se apaixonou!

O GAROTO SE LEVANTA E CANTA PARA A PRINCESA.

Princesa        – Ai que lindo! Como ele é lindo!

Mago              – Ei, garoto, você que é o príncipe?

Princesa        – (SUSPIRANDO) Ele é um príncipe!

Garoto            – Não! Eu só fui contratado para cantar no casamento da Princesa. E quem é ela?

Mago              – A Princesa!

Princesa        – (PARA O GAROTO) Você quer casar comigo?

Garoto            – Uau! Gostei daqui! Não sabia que toda Princesa era decidida!

Mago              – Mas não é ele, Princesa!

Princesa        – É sim! (PARA O GAROTO) Não é?

Garoto            – Sou! Sou o quê você quiser, princesa!

Princesa        – Olha só, Mago, é ele, o meu Príncipe!

A PRINCESA AGARRA O GAROTO E LHE DÁ UM BEIJO.

Mago              – Vou ter que dar um jeito nessa situação.

O GAROTO SE AFASTA.

Garoto            – Caramba, Princesa! Tu tem pegada, hein? Acho que vou me dar bem por aqui.

O GAROTO TENTA AGARRAR A PRINCESA. O MAGO TENTA IMPEDI-LO.

Mago              – Escute aqui, rapaz! Ela não é pra você!

Garoto            – Não me atrapalha, seu velhaco! Me deixa em paz que agora a princesa é minha.

O GAROTO EMPURRA O MAGO NO CHÃO, QUE DEIXA CAIR A GARRAFINHA DO SEU BOLSO.

Garoto            – (PEGANDO A GARRAFA) Olha só, o velhaco anda com a própria bebida no bolso. Vou tomar isso que to com uma sede monstro!

Mago              – (SE LEVANTANDO) Não bebe isso!

A PRINCESA OLHA O GAROTO APAIXONADO. O GAROTO ABRE A GARRAFA E BEBE O LÍQUIDO DE UMA VEZ SÓ.

Mago              – Agora seja o que Deus quiser!

O GAROTO PARA ESTÁTICO OLHANDO A PRINCESA.

Garoto            – Princesa!

Princesa        – Fala, meu Príncipe!

Garoto            – Quer casar comigo?

Mago              – Deu certo! Deu certo! Encontrei a fórmula do amor! Encontrei a fórmula do amor. É só beber que o amor é imediato! Eureka! Preciso esconder minha poção!

O MAGO SAI EUFÓRICO DE CENA. A PRINCESA E O GAROTO ESTÃO PARADOS, SE OLHANDO.

Garoto            – Você é linda!

Princesa        – Você é lindo!

OS DOIS DANÇAM. O GAROTO TENTA BEIJAR A PRINCESA, QUE O EMPURRA.

Princesa        – Que audácia! Que garoto mais atrevido! Quem você pensa que é para querer beijar a Princesa?

Garoto            – Sou seu Príncipe Encantado, princesa!

Princesa        – Que príncipe, o quê? Se enxerga, Mané!

A PRINCESA SAI DE CENA.

Garoto            – Volta aqui, minha Princesa! Casa comigo!

O GAROTO SAI ATRÁS. APAGAM-SE ÀS LUZES. FECHAM-SE AS CORTINAS. 

– FIM –

 


DEPOIS DAQUELA CANÇÃO

janeiro 10, 2020

TEXTO ADULTO DE CURTA DURAÇÃO

AUTOR: PAULO SACALDASSY

PERSONAGENS

HEITOR

JULIA

CENÁRIO: UMA CAMA DE CASAL NO CENTRO DO PALCO, DE UM LADO, UMA CÔMODA, E DO OUTRO UM GUARDA-ROUPA. DE UM DOS LADOS, A PORTA DO QUARTO.

AO ABRIR AS CORTINAS, O PALCO ESTÁ ESCURO, APENAS UM FOCO DE LUZ SOBRE O CASAL QUE ESTÁ SENTADO NO CHÃO, AOS PÉS DA CAMA, UM COM AS COSTAS ENCOSTADAS NO OUTRO. ELE VESTE APENAS CUECA E ELA, CALCINHA E SUTIÃ. AOS POUCOS A LUZ VAI ABRINDO ATÉ LUZ GERAL.

Julia                 – Acho que a gente exagerou um pouco no vinho!

Heitor             – Só um pouquinho!… Mas, foi bom, não foi?

Julia                – Sabe há quanto tempo a gente não faz isso?

Heitor             – Ah!… Sei lá!… No casamento da tua irmã?

Julia                – É!… No casamento na minha irmã! Sabe quanto tempo faz isso?

Heitor             – Dois anos?                              

Julia                – Cinco!… Cinco anos!

Heitor             – O tempo tá voando mesmo!

Julia                – Sabe o que isso significa?

Heitor             – Já falei!… O tempo tá voando!

Julia                – Nada disso! Isso significa que as coisas não são mais como antes.

Heitor             – Como não?

Julia                – Se lembra quando a gente se conheceu?

Heitor             – Claro! Timtim por timtim! Lembro até a roupa que você estava?

Julia                – Taí, quero ver!

Heitor             – Você estava de vestido vermelho, sapatos de salto alto…

Julia                – Pára, Heitor!

Heitor             – Não era essa?

Julia                – Claro que não!

Heitor             – E qual era?

Julia                – Calça Jeans e camiseta!

Heitor             – Jura?

Julia                – Claro!

Heitor             – Acho que você tá fazendo confusão por causa do vinho!

Julia                – Não vou nem discutir!

Heitor             – Quer ver como vou te provar que eu tô certo?

Julia                – Duvido!

Heitor             – A gente se conheceu na fila do cinema!

Julia                – Errado!

Heitor             – Como errado?

Julia                – Foi na fila do banco!

Heitor             – Olha aí! Não falei que foi na fila?

Julia                – Tenho saudades daqueles tempos!

Heitor             – Eu também!

Julia                – Se lembra que você me prometeu as estrelas?

Heitor             – Te levei as alturas várias vezes! Você não pegou porque não quis!

Julia                – Sem graça!

Heitor             – Você lembra daquela música?

Julia                – Como eu ia esquecer?

HEITOR LEVANTA-SE, PEGA JULIA E COMEÇA A CANTAR UMA MÚSICA RO-MÂNTICA (A ESCOLHA). OS DOIS DANÇAM AGARRADINHOS PELO PALCO.

Heitor             – Eu me lembro de tudo!

Julia                – Eu também!

Heitor             – Sua boca!…

Julia                – Seus olhos!…

Heitor             – Seu olhar!…

Julia                – Seu beijo!

OS DOIS BEIJAM-SE APAIXONADOS, ENQUANTO VÃO DANÇANDO.

Julia                – Espera, Heitor!… Tô vendo tudo rodar!

Heitor             – Fecha os olhos!

Julia                – Pára, Heitor!

Heitor             – Tá bom!

OS DOIS PARAM. JULIA SENTA-SE NA CAMA.

Julia                – Acho que por hoje chega!… Amanhã vou ter um dia duro!

Heitor             – Esquece amanhã!

Julia                – Não posso!

Heitor             – Só hoje!

Julia                – Agora chega, Heitor!… Tô cansada! Vou deitar!

Heitor             – Só mais um pouquinho!

Julia                – Vem, vamos deitar, vai!

Heitor              – Julia!

Julia                – Fala, Heitor!

Heitor             – Sabe, a Helena?

JULIA SE LEVANTA DA CAMA.

Julia                – Não acredito que você vai terminar nossa noite com essa mulher!

Heitor             – É que tenho uma coisa importante pra falar!

Julia                – Essa mulher é uma fantasma em nossa vida!

Heitor             – Nunca foi um fantasma!

Julia                – Não se faça de mal entendido!

Heitor             – Tudo bem!… Deixa pra lá!

Julia                – Agora que já estragou a noite, fala!

Heitor             – Hoje a gente bebeu demais! É melhor, não!

Julia                – Ela não foi morar fora do país?

Heitor             – Foi! Você não lembra?

Julia                – Como é que eu ia esquecer? Você não deixa, não é mesmo?

Heitor             – Quem escuta pensa que eu falo nela todo dia!

Julia                – É, mas é só beber um pouquinho a mais, que lá vem você e essa Helena! Às vezes acho que você só ficou comigo porque ela foi embora!

Heitor             – Uma coisa não tem nada a ver com a outra!

Julia                – Na certa, quando tava comigo, pensava na outra! Ah, como teria sido com ela?

Heitor             – Não fala isso! Você sabe que isso não é verdade!

Julia                – Mas, desembucha! O que é que foi com a Helena? Morreu?

Heitor             – Vamos dormir!… Você tem razão, a gente exagerou no vinho!

HEITOR SE DEITA NA CAMA. JULIA ANDA PELA CENA.

Julia                – Eu não acredito! Uma noite maravilhosa dessa, e você tinha que tocar no nome daquela mulher!

Heitor             – Chega, Julia!

Julia                – Diz, Heitor, diz! O que é que tem a Helena?

HEITOR SENTA-SE NA CAMA.

Heitor             – A Helena voltou!

Julia                – E o que é que tem?

Heitor             – Ela me procurou!

Julia                – Que vagabunda!

Heitor             – A gente conversou!

Julia                – Bem que eu estava desconfiada nesta noite especial!

Heitor             – A gente tinha muito que conversar!

Julia                – Deviam ter, mesmo!

Heitor             – Assim vai ficar difícil!

Julia                – Tantos anos longe, não é mesmo?

Heitor             – A gente resolveu…

Julia                – Só espero que você não tenha feito nenhuma besteira!

Heitor             – A gente vai se dar uma chance!

JULIA DESABA SOBRE A CAMA.

Heitor             – Eu tava indeciso, mas… Olha!… Julia!… Eu não queria!…

Julia                – Eu não acredito!

Heitor             – Eu quero que você entenda! Não foi uma coisa pensada!

Julia                – Eu sempre esperei por isso! Sabia que mais cedo ou mais tarde, isso ia acontecer!

Heitor             – Não era a minha intenção! Juro!

JULIA LEVANTA-SE.

Julia                – Todos esses anos, e você brincando de casinha comigo, não é?

Heitor             – Não!… Eu sempre fiz tudo por você!

Julia                – Eu sei muito bem, o tudo que você fez!

Heitor             – A gente foi feliz!

Julia                – Só se for na fotografia!

Heitor             – Não fala assim!

Julia                – Tudo que abri mão por você!

Heitor             – Eu também tive que fazer isso!

Julia                – As coisas que eu fiz por você!

Heitor             – Eu não pedi nada!

Julia                – Eu fiz por amor! Por amor! Mas, você não sabe o que é isso!

Heitor             – Eu não queria te magoar!

Julia                – Não quero tua piedade!

Heitor             – Amanhã mesmo eu vou embora!

Julia                – Some da minha frente! Não quero ver mais essa sua cara deslavada!

Heitor             – Não faz assim, Julia! A gente sempre foi amigo!

Julia                – Sabe o que você faz com essa amizade?

Heitor             – Assim você está deixando as coisas mais difíceis!

Julia                – Ah! Você achava que seria tudo fácil? Você chegava e dizia assim: Olha, Julia, sabe da Helena? É, a Helena! Encontrei com ela e a gente resolveu que vai ficar juntos! Aí então, eu virava pra você e dizia: Claro, Heitor! Pode ir com ela, eu não me importo!… Vai à merda, Heitor! Vai à merda!

Heitor             – Eu sabia que não seria fácil, mas você tá complicando ainda mais!

Julia                – Ah! Quer dizer que pra você, um casamento de dez anos acaba assim… feito poeira! Você vem e me assopra pra fora da tua vida!

Heitor             – Você sabe que não é nada disso!

Julia                – Olha, Heitor! Melhor você sair desse quarto, senão!…

Heitor             – Senão o quê?

Julia                – Não me obrigue a falar coisas que não quero falar!

Heitor             – Por que você está tornando tudo tão difícil?

Julia                – Quem te falou que eu queria me separar de você?

Heitor             – Não se trata disso!

Julia                – Ah! Esqueci que você quem toma a decisão! Eu só digo:sim senhor!

Heitor             – Não estava nos meus planos!

Julia                – Você nunca esqueceu essa vagabunda! Ficou comigo por conveniência!

Heitor             – Isso é mentira!

Julia                – Tinha levado um pé na bunda, e como tinha uma trouxa te dando bola, você foi lá, e eu, caí feito uma patinha!

Heitor             – Eu fui verdadeiro com você! Eu senti cada momento de prazer!

Julia                – Eu sei! Sei tanto, que até acreditei que você jamais teria coragem de fazer o que está fazendo hoje!

Heitor             – Você acha que eu passei a minha vida inteira fazendo planos para o dia que eu fosse me separar de você?

Julia                – Some da minha frente!

Heitor             – Eu devia ter feito isso antes!

Julia                – Eu vou acabar com você!

Heitor             – Você está me fazendo arrepender de cada momento que eu passei com você!

Julia                – Eu já me arrependi disso, faz tempo!

HEITOR ABRE O GUARDA-ROUPA E COMEÇA APANHAR SUAS ROUPAS.

Heitor             – Pensei que pudesse ficar com você essa noite pra que a gente se entendesse!

JULIA VAI ATÉ A CÔMODA, ABRE AS GAVETAS E COMEÇA ATIRAR ROUPAS EM CIMA DE HEITOR. HEITOR SE VESTE.

Julia                – Como você é bonzinho!

Heitor             – Chega de ironia!

Julia                – Ah, o moço não quer ironia?

Heitor             – Não me tire do sério!

Julia                – Por quê? Vai me matar?

Heitor             – Não me obrigue a fazer o que eu não quero!

Julia                – Você pode me obrigar a fazer o que eu não quero, né? Engraçado!

Heitor             – Acho que nesse caso, não é questão de obrigar ninguém a nada!

Julia                – Ah! Tem razão, você apenas fez uma comunicação!

Heitor             – Não achei que seria assim?

Julia                – E é melhor a gente parar por aqui!

Heitor             – É melhor mesmo!

HEITOR  COMEÇA  A  AJEITAR SUAS ROUPAS DENTRO DA MALA. JULIA VAI, DEITA-SE NA CAMA DE COSTAS PARA HEITOR. SILÊNCIO.

Heitor             – Olha, Julia! Não foi por mal!

Julia                – Tá bom, Heitor, já entendi!

Heitor             – Eu preferia que não tivesse sido assim!

Julia                – Tudo bem, Heitor, tudo bem!

Heitor             – Então, eu vou embora!

Julia                – Tchau!

Heitor             – Desculpe, Julia!

Julia                – Espera Heitor!

Heitor             – Fala!

Julia                – Você tem certeza do que está fazendo?

Heitor              – Certeza eu não tenho!

Julia                – Mas, vai fazer assim mesmo?

Heitor             – Só quero que você saiba que não foi nada com você!

Julia                – Pode até ser!

Heitor             – Preciso resolver isso comigo! Aqui dentro!

Julia                – Heitor!

HEITOR ESTÁ PRÓXIMA DA PORTA DO QUARTO.

Heitor             – Fala!

Julia                – Preciso te falar uma coisa!

Heitor             – Pode falar!

Julia                – Eu tenho outra pessoa!

HEITOR SOLTA A MALA NO CHÃO.

Heitor             – O quê?

Julia                – Nós estamos juntos há um ano!

Heitor             – Não acredito!

Julia                – Mas, eu precisava te contar!

JULIA DEITA-SE NA CAMA.

Heitor             – Não pode ser!

Julia                – Quando sair, apaga luz, tá?

Heitor             – Como você pode?

Julia                – É que amanhã tenho um compromisso!

Heitor             – Sua descarada!

Julia                – Vou ser feliz!

Heitor             – Você não podia ter feito isso!

Julia                – Boa sorte com a sua Helena!… Não esquece de apagar a luz, hein?

JULIA VIRA DE COSTAS PARA HEITOR. HEITOR VEM EM DIREÇÃO A CAMA E SACODE JULIA SEM PARAR, QUE NÃO REAGE, APENAS RI.

Heitor             – Por quê você fez isso? Por quê?

BLACK OUT. JÚLIA DÁ GARGALHADAS. AS GARGALHADAS VÃO SUMINDO AOS POUCOS, DANDO LUGAR A GEMIDOS DESESPERADOS. LUZ GERAL. JULIA ESTÁ ESTIRADA NA CAMA COM O TRAVESSEIRO SOBRE O SEU ROSTO. HEITOR PEGA SUA MALA E SAI.

APAGUAM-SE AS LUZES. FECHAM-SE AS CORTINAS.

FIM

                                                         


O AMOR NUNCA MORRE

novembro 1, 2019

TEXTO DE TEATRO INFANTIL

AUTOR

Paulo Sacaldassy

PERSONAGENS

Menino

Duende do Amor

Duende da Alegria

Fada da Imaginação

Fada da Felicidade

Globin

Duendes

CENÁRIO: Uma Floresta Encantada

NO PALCO, OS ATORES CANTAM.

AGORA O MUNDO ESTÁ TRISTE

TODO MUNDO QUER BRIGAR

A PAZ JÁ NÃO EXISTE

SÓ SABEM SE ODIAR

ONDE ESTÁ O AMOR?

SERÁ QUE ELE MORREU?

POR QUE SÓ QUEREM A DOR?

 O QUÊ ACONTECEU?

É PRECISO ENCONTRAR

O CAMINHO, A DIREÇÃO

VER ONDE O AMOR ESTÁ

PARA DEVOLVÊ-LO AO CORAÇÃO

VEM COM A GENTE PROCURAR

SEJA LÁ POR ONDE FOR

É PRECISO ENCONTRAR

ONDE SE ESCONDEU O AMOR

Atores – Onde está o amor?

OS ATORES SAEM DE CENA REPETINDO A FRASE. FICA EM CENA APENAS O MENINO. ELE VAI ATÉ O PROSCÊNIO

Menino – Onde está o amor?… Já sei!… Preciso falar com os meus amigos duendes para me ajudarem a encontrar o amor. Vou chamar a Fada da Imaginação para me levar até lá agora!

O MENINO SE SENTA NO CHÃO EM POSIÇÃO DE MEDITAÇÃO. FECHA OS OLHOS E PEDE.

Menino – Fada da Imaginação, preciso de você!

UMA EXPLOSÃO DE LUZES. SURGE EM CENA UMA FADINHA.

Fadinha – Oi, meu amigo! Tudo bem?

Menino – Não! O amor sumiu!

Fadinha – Não acredito! E o que você quer de mim?

Menino – Tenho que ir na floresta encantada pedir ajuda para os meus amigos duendes. Eles podem ajudar a gente encontrar o amor.

Fadinha – Mas ir até lá pode ser perigoso!

Menino – Eu não tenho medo! A gente precisa encontrar o amor!

Fadinha – Então se prepare para viajar!

A FADINHA ENTREGA UM GORRO DE DUENDE AMARELO.

Fadinha – Agora coloque isso e me dê a mão!

O MENINO COLOCA O GORRO E DÁ A MÃO PARA FADINHA, OS DOIS ANDAM PELA CENA ENQUANTO CANTAM.

A NOSSA VIAGEM

PRA FLORESTA ENCANTADA

VAI SER FEITA DE CORAGEM

AVENTURAS NA ESTRADA

PODEM HAVER MUITOS PERIGOS

MAS VAI SER ESPECIAL

ENCONTRAR NOSSOS AMIGOS

LÁ NO SEU FINAL

VAMOS VIAJAR

PARA PROCURAR O AMOR

QUEM SABE NA FLORESTA

ALGUÉM JÁ NÃO O ACHOU

OS DOIS CHEGAM AO CENTRO DA FLORESTA E LOGO AVISTAM VÁRIOS DUENDES ANDANDO.

Fadinha – Bom, chegamos na floresta encantada!

UNS DUENDES TENTAM ALEGRAR UM DUENDE QUE ESTÁ SENTADO EM UMA PEDRA..

Menino – Olha lá meus amigos duendes!

O MENINO CHEGA PERTO E OS DUENDES SE ESCONDEM ENTRE AS ÁRVORES. FICA SÓ O DUENDE SENTADO NA PEDRA.

Menino – Ei, mas você é o duende da alegria! Eu conheço você! Porque hoje você não está alegre?

Fadinha – Você me parece bem triste! O que aconteceu?

Duende – O Duende do Amor sumiu!

ENTRA EM CENA, OUTRA FADA.

Felicidade – Alegria, não adianta, não consigo encontrar o Duende do amor! Acho que ele saiu da floresta encantada e foi morar de vez lá no mundo dos humanos.

Menino – Não foi, não! No nosso mundo também não tem mais amor! Eu vim aqui pedir ajuda de vocês!

Duende – É, mas não vamos poder ajudar você! Não é mesmo felicidade?

Felicidade – É mesmo, Alegria!

O DUENDE DA ALEGRIA E A FADA DA FELICIDADE SE ABRAÇAM.

Fadinha – Mas já que estamos aqui, vamos virar essa floresta de cabeça pra baixa, até a gente encontrar o duende do amor.

Menino – É isso! Vamos encontrar o amor!

OS QUATROS ANDAM PELA CENA ENQUANTO CANTAM.

EM ALGUM LUGAR

DESTE MESMO LUGAR

A GENTE HÁ DE ENCONTRAR

ONDE O AMOR SE ESCONDEU

NÃO VAMOS PARAR

NEM MESMO PRA DESCANSAR

ENQUANTO A GENTE NÃO ACHAR

ONDE O AMOR SE METEU

E SE ELE ESTÁ EM PERIGO?

SE ELE ESTÁ PRISIONEIRO?

SE FOI ALGUM INIMIGO?

QUAL O SEU PARADEIRO?

AMOR, CADÊ VOCÊ?

Os Quatro – Amor, cadê você? Amor, cadê você!….

OS QUATRO CHEGAM AO LADO ESCURO DA FLORESTA.

Menino – Que lugar é esse?

Duende – Daqui é melhor a gente não passar.

Felicidade – Aqui é o terreno do Globin.

Fadinha – E quem é esse Globin?

Duende – Ele é inimigo dos duendes, não gosta de alegria, de felicidade, só gosta de fazer o mal.

Menino – Então ele pode ter roubado o amor!

Fadinha – Isso! Quem sabe não foi ele que raptou o duende do amor?

Duende – Eu não vou lá!

Felicidade – Nem eu!

SURGE DA ESCURIDÃO, GLOBIN, O DUENDE DO MAL. ELE VEM CANTANDO.

QUEM OUSA ENTRAR

AQUI NAS MINHAS TERRAS

SE VEIO PERTURBAR

ESTÁ QUERENDO GUERRA

NÃO GOSTO DE VISITA

NÃO GOSTO DE NINGUÉM

E QUEM AQUI SE ARRISCA

PODE SOFRER TAMBÉM

PORQUE EU GOSTO DA MALDADE

EU GOSTO DE SER RUI M

ESSA É MINHA VERDADE

E VAI SEM SEMPRE ASSIM

Globin – Agora sumam daqui! Agora!

Menino – É que nós estamos procurando o amor.

Fadinha – Isso! Por acaso o senhor não viu o amor?

GLOBIN DÁ UMA RISADA ASSUSTADORA.

Duende – Ele não veio por aqui, veio?

Globin – Ele achou que podia amolecer o meu coração.

GLOBIN DÁ OUTRA RISADA ASSUSTADORA.

Fadinha – O que você fez com ele, seu malvado?

O DUENDE DA ALEGRIA AVISTA O DUENDE DO AMOR PETRIFICADO. PARADO COMO UMA ESTÁTUA.

Duende – Aquele é o duende do amor!

Felicidade – Ele virou uma estátua!

Menino – O amor morreu!

Fadinha – Não! Ele só está dormindo. Preciso quebrar esse feitiço

A FADA DA IMAGINAÇÃO APONTA SUA VARINHA PARA O DUENDE DO AMOR, MAS GLOBIN SOLTA UM RAIO E CONGELA A FADINHA TAMBÉM

Globin            – Agora sumam daqui, ou todos vão virar estátuas!

O MENINO VAI ATÉ O DUENDE DO AMOR, COLOCA O SEU GORRO MÁGICO NA CABEÇA DO DUENDE E QUEBRA O FEITIÇO, FAZ O MESMO COM A FADA DA IMAGINAÇÃO.

Globin – (FURIOSO) Você não devia ter feito isso!

GLOBIN SOLTA UM RAIO NA DIREÇÃO DO MENINO, QUE SE PROTEGE COM O GORRO.  RAIO VOLTA E CONGELA GLOBIN.

TODOS SE ABRAÇAM E COMEMORAM. VOLTAM CANTANDO PELA FLORESTA. OS OUTROS DUENDES DA FLORESTA VÃO SE JUNTANDO A ELES. TODOS CANTAM.

O AMOR NÃO MORRE

ESCORRE PELAS LÁGRIMAS

DE SAUDADE

O AMOR NÃO MORRE

COMBATE AS LÁSTIMAS

DA MALDADE

O AMOR NÃO MORRE

É SEMENTE

É GRÃO QUE FECUNDA

NO CORAÇÃO

O AMOR NÃO MORRE

É ÁGUA PURA

QUE MATA A SEDE

DE FAZER O BEM

NÃO IMPORTA A QUEM

SÓ O AMOR

PODE AJUDAR

NOSSA VIDA MELHORAR

E A PAZ SE RESTABELECER

SÓ O AMOR

PODE JUNTAR

 O QUE O ÓDIO FEZ QUEBRAR

ENTRE MIM E VOCÊ

FECHAM-SE AS CORTINAS. FIM.


COM POLÍTICO NINGUÉM PODE

setembro 20, 2019

AUTOR

Paulo Sacaldassy

PERSONAGENS

POLÍTICO

ANJO

DIABO

CENÁRIO: QUARTO DE UM HOSPITAL

EM CENA, UM HOMEM DEITADO EM UMA CAMA, ESTÁ LIGADO A UM MONITOR CARDÍACO. ENTRA UM HOMEM DE TERNO AZUL CLARO.

Anjo    – É, meu amigo, parece que essa sua jornada por aqui está chegando ao fim. E como você me deu trabalho nessa sua vida, hein? Eu, um anjo acostumado a proteger todo tipo de pessoa, confesso: por muitas pensei em desistir dessa missão, acompanhar político não é tarefa fácil! Mas parece que agora sua jornada vai terminar e eu vou aproveitar para conseguir umas férias, porque acompanhar na Terra outro igual a você, sem condições!

O HOMEM ABRE OS OLHOS

Político – (FALANDO COM DIFICULDADE) Quem está aí?

Anjo      – Sou eu, o seu anjo da guarda. Mas não se preocupe, vai ficar tudo bem!

Político – Mas quem te mandou aqui?

Anjo       – Ninguém! Eu já lhe acompanho a vida inteira e não podia lhe abandonar justamente neste momento tão delicado!

Político – (SEGURA A MÃO DO ANJO) É muito bom saber que até nosso anjo da guarda está do nosso lado nessas horas.

Anjo       – Tudo bem! Agora descanse para não apressarmos o processo.

Político  – Muito bom saber que você está comigo.

O POLÍTICO SENTE O CORPO TREMER POR DEBAIXO DO LENÇOL.

Anjo       – Calma!  Vai ficar tudo bem!

ENTRA EM CENA, HOMEM VESTIDO DE TERNO ROXO.

Diabo    – Bom dia! Por acaso aqui é o quarto do Deputado Epaminondas Maciel?

Anjo       – Sim! O que o senhor deseja?

Diabo    – Vim buscá-lo

Político  – Como assim?

Anjo       – Quem é o senhor?

Diabo   – (ESTENDENDO A MÃO PARA O ANJO) Prazer, eu sou o Diabo! E vim buscar o nobre Deputado que tanto fez por merecer um lugarzinho comigo lá no inferno.

Político – Deve estar havendo algum mal entendido. Ô meu anjo, como a gente fica?

Anjo       – Fique tranquilo que ele não tem poder pra isso?

O DIABO TIRA DO BOLSO DO TERNO, UMA LISTA.

Diabo    – Vejamos!

Político  – Não estou gostando nada disso, seu anjo!

O CORPO DO POLÍTICO TREME OUTRA VEZ POR DEBAIXO DO LENÇOL

Diabo    – Segundo a minha lista, o nobre Deputado tem feito brilhantes trapaças que o condecoraram, com excelência, e lhe garante um lugar de destaque lá no inferno.

Político  – Isso é sério? Quais são os meus benefícios?

Anjo       – Deputado! Então me prove.

Político  – Não faz isso, seu Diabo!

Diabo    – Vamos começar com o primeiro cargo público do nobre político.

Político  – Aí eu estou tranquilo.

O ANJO TIRA DA ROUPA UMA AGENDA E COMEÇA A FOLHEÁ-LA..

Diabo    – O nobre Deputado, foi convidado a ocupar a Secretaria de Recursos Humanos da Prefeitura de… (O DIABO PROCURA O NOME)… Bem, não importa, importa o feito, porque esse foi brilhante.

Político  – Puxa, eu nem me lembrava disso! É, fui brilhante!

Anjo       – Não existe nada que ele tenha feito de errado nessa época. Tenho tudo anotado aqui!

Diabo    – É justamente aí que mora o brilhantismo da empreitada.

Político  – Fui brilhante mesmo! E as tontas das meninas estão respondendo processo até hoje.

Anjo        – Mas o quê você fez de tão errado que eu não fiquei sabendo?

Político   – Deixa pra lá! Isso já faz muito tempo…

Anjo        – Eu preciso saber. Como vou lhe defender?

Diabo     – Eu lhe conto, querido anjo. O nobre Deputado convenceu as duas responsáveis do setor de folha de pagamento, a incluir funcionários fantasmas na folha da Prefeitura, de preferência alguém que elas tivessem contato e creditavam os salários em contas de parentes das funcionárias fantasmas e, depois, dividiam oitenta por cento para ele e vinte por cento para elas. Um plano perfeito! E a culpa caiu em cima de quem? Das funcionárias. Brilhante!

Anjo      – Mas foram as funcionárias que se desviaram de seus caminhos.

Político – É, isso é verdade! Só tive a ideia e lucrei o dinheiro, o trabalho sujo não foi meu!

Diabo    – Mas não seja por isso, tenho mais.

O DEPUTADO SENTE NOVAMENTE O CORPO TREMER SOB O LENÇOL..

Anjo       – Só que ele fez também, muita coisa boa nessa sua jornada. Deixe eu lhe mostrar essa aqui.

Político  – Isso também é verdade! Ajudei muita gente.

Diabo    – Sempre com segundas intenções, nobre Deputado.

Anjo       – Engano seu, meu amigo. Tenho aqui. (FOLHEANDO A AGENDA) Aqui! Assim que assumiu como Deputado pela primeira vez, ele criou uma lei que beneficiou dezenas de moradores que estavam em uma área de proteção à regularizar seus terrenos, fazendo que cada um deles se tornasse proprietário de sua casa. Um gesto digno e de quem pensa no semelhante.

Político – Deu trabalho, mas valeu à pena!

Diabo    – Mas acho que o meu amigo não cumpriu direito sua missão com o nosso amigo Deputado.

Anjo      – Como assim?

Político – Como assim?

Diabo  – Por acaso meu amigo anjo tinha conhecimento que os maiores terrenos daquele lugar estavam em nome de pessoas de confiança do Deputado e que depois passaram os terrenos para ele, de graça?

Anjo       – Verdade?

Político  – Verdade, meu anjo!

Diabo    – Bom, eu poderia ficar aqui o dia todo enumerando os feitos brilhantes do nobre Deputado, mas acho que não é mais necessário nos alongarmos nessa disputa, meu amigo, anjo. Está decidido: O Deputado vem comigo!

Anjo      – Nada disso! Eu sei que ele tem inúmeros defeitos, mas, no fundo, é uma alma boa, e merece uma nova chance no paraíso, para reaprender e voltar como um novo homem.

Diabo   – Nem pensar! Não vou perder essa alma brilhante. Isso é um espécime raro de político corrupto!

O CORPO DO DEPUTADO NÃO PARA DE TREMER SOB O LENÇOL. O DEPUTADO PUXA DE DEBAIXO DO LENÇOL, O SEU CELULAR.

Político – Desculpe vocês dois, mas agora vou ter de atender. Tava vibrando demais no meio das minhas pernas..

O ANJO E O DIABO SE ENTREOLHAM.

Politico – Fala, Peixoto! Conseguiu o habbeas corpus?… Maravilha!… Manda preparar o jatinho que eu vou voar hoje mesmo… Claro!… Você acha que eu vou ficar dando sopa pra polícia me trancar como já fez com um monte?… Sou macaco velho! Se eu não caio doente aqui nesse hospital, que é do meu amigo, a polícia me pegava! Pode pedir para o Jarbas vir me buscar agora. Já tá na porta?… Isso que é eficiência, Peixoto. Merece até uma gratificação. Ok. Já estou saindo.

O DEPUTADO DESLIGA O CELULAR, DESLIGA OS FIOS DO APARELHO, SENTA NA CAMA PARA AMARRAR SEUS SAPATOS.

Anjo      – Que significa isso?

Político – Vem comigo que no caminho eu explico.

Anjo       – Como assim?

Político – Vamos, Anjo, eu não tenho muito tempo. A sua missão é cuidar de mim, não é? Então vamos!

Diabo    – Se o nobre Deputado permitir, posso lhe acompanhar.

Anjo       – Agora você não se mete que esse assunto é nosso.

Político  – Vamos, Anjo, eu não tenho a vida toda!

Anjo       – Eu não acredito que você enganou a mim e ao Diabo?

Diabo    – A mim, não! Eu só recebi uma mensagem avisando da entrada dele aqui no hospital, não podia perder a oportunidade. Tô de olho neste Deputado faz tempo.

Anjo       – Eu não acredito que você foi capaz de fazer isso comigo.

Político  – Precisava salvar minha pele. Queria que eu fosse preso?

Diabo    – Até um dia, nobre Deputado! O senhor é brilhante!

Anjo       – Era melhor!

Político  – Você é meu anjo, ou não é?

O DEPUTADO E O ANJO VÃO SAINDO DE CENA, DISCUTINDO. O DIABO SE DEITA NA CAMA.

Diabo    – É, o anjo pegou uma missão daquelas, porque com político, ninguém pode! Mas, um dia, ainda levo o nobre Deputado pra morar comigo no inferno! Já fico até imaginando o que a gente pode fazer juntos!

O DIABO SE LEVANTA DA CAMA E SAI ATRÁS DO DEPUTADO.

Diabo     – Deputado, tenho uma proposta pra lhe fazer! Espere!

– FIM –

 


Um Rei no rio

julho 19, 2019

PERSONAGENS

Peixe

Sapo/Rei

Tartaruga

CENÁRIO: FUNDO DE UM RIO POLUÍDO, COM PEDAÇOS DE PANOS E PLÁSTICOS PENDURADO, ALGUMAS PEDRAS E PLANTAS AQUÁTICAS. UM SAPO ENTRA EM CENA COMO SE TIVESSE SIDO JOGADO PARA DENTRO DO RIO.

Sapo              – Ei, alguém me ajude, por favor! Eu não sei nadar! Alguém me tira do fundo deste rio! Eu sou o Rei! Quem ousou jogar o Rei dentro do rio? (RESPIRA COM DIFICULDADES) Socorro!… Acho que vou morrer… (DESABA NO CHÃO).

ENTRA EM CENA UM PEIXE, TODO SUJO DE ÓLEO, COM RESTOS DE REDES E PANOS AMARRADOS NO CORPO. TOSSE. TROPEÇA NO SAPO

Peixe             – Eita que é um Sapo! Mas um Sapo no fundo do rio?! É, isso aqui tá mesmo indo de mal a pior! Aonde já se viu um Sapo no fundo de rio! Se num bastasse todo esse lixo e esgoto na nossa água, agora me aparece um Sapo bem aqui no fundo. (CUTUCANDO O SAPO) Ei, seu Sapo! O que você ta fazendo por aqui? Se ficar aqui no fundo vai acabar morrendo!

O SAPO ABRE O OLHO E FALA COM DIFICULDADE.

Sapo              – Me ajude, seu Peixe, por favor!

Peixe             – O que você está fazendo aqui?

Sapo              – Me jogaram aqui dentro! Eu não consigo respirar.

Peixe             – Quem jogou você aqui?

Sapo              – (FALANDO COM DIFICULDADE) Foi a bruxa!

Peixe             – Ih, o Sapo já ta até delirando! Deve ta faltando ar no cérebro da criatura! (AJUDANDO O SAPO A LEVANTAR)

Sapo            – (RESPIRANDO COM DIFICULDADE) Eu não consigo respirar! Me ajude! Acho que vou… (E O SAPO DESABA NOVAMENTE NO CHÃO)

O PEIXE SE APROXIMA, SENTE A RESPIRAÇÃO.

Peixe              – É, o caso é muito grave! Preciso buscar ajuda. Esse Sapo não vai aguentar muito tempo aqui no fundo do rio. Aguenta firme aí que eu vou buscar ajuda!

O PEIXE SAI DE CENA. O SAPO SE LEVANTA COM DIFICULDADE.

Sapo              – (RESPIRANDO COM DIFICULDADE) Preciso sair daqui! Tenho que voltar para superfície! Tem que ser agora, ou nunca. Eu vou conseguir! (O SAPO DÁ UM PULO E AGARRA EM ALGUNS PEDAÇOS DE PANO E VAI SAINDO DE CENA USANDO OS PANOS PENDURADOS).

ENTRA O PEIXE.

Peixe             – Ele tava bem aqui, ó! Ei, Dra. Tartaruga, cadê a senhora?

O PEIXE VOLTA ATÉ A COXIA PARA BUSCAR A TARTARUGA. VOLTA RÁPIDO AO PALCO.

Peixe             – Deixei o Sapo caído logo ali! Como é Dra.? É pra hoje ou pra amanhã?

ENTRA EM CENA, VAGAROSAMENTE, UMA TARTARUGA VESTIDA DE MÉDICA.

Peixe             – Anda, Dona Tartaruga, senão o Sapo não vai aguentar!

Tartaruga      – Calma, Peixe, devagar!

Peixe             – Mas o Sapo está morrendo!

Tartaruga      – Eu ainda não acredito nessa sua história, aonde já se viu um Sapo no fundo do rio?

Peixe             – Ele falou que uma bruxa jogou ele aqui dentro.

Tartaruga      – Uma bruxa? Sei!

Peixe             – Eu também não acreditei, mas ele não está bem, por isso fui buscar a sua ajuda.

Tartaruga      – Estou achando essa história muito estranha!

O PEIXE PARA E NÃO VÊ O SAPO.

Peixe             – Seu Sapo! Seu Sapo!

Tartaruga      – Cadê o Sapo, seu Peixe?

Peixe             – Ele estava aqui! Deitado! Quase morrendo.

A TARTARUGA COMEÇA A EXAMINAR O PEIXE.

Peixe             – Que isso, Dra.? Pare com isso!

Tartaruga      – Acho que o senhor não está bem, seu Peixe! Acho que toda essa poluição do rio está afetando a sua saúde. O senhor anda comendo esses lixos que jogam aqui dentro?

Peixe             – Eu não estou doente!

O PEIXE COMEÇA A TOSSIR.

Tartaruga      – Olha aí essa tosse! Fique quieto! Deixe eu lhe examinar direito.

Peixe             – É o Sapo que está doente, não sou eu!

O PEIXE VOLTA A TOSSIR.

Tartaruga      – O senhor anda bebendo essa água poluída que estão jogando dentro do rio?

A TARTARUGA TIRA DO BOLSO DO JALECO UM COMPRIDO E ENTREGA AO PEIXE.

Tartaruga      – Agora o senhor tome esse comprimido e vá descansar um pouco, pois o senhor está com sintomas de doente. Está tossindo muito. E cuidado com o quê come e com o quê bebe, pois esse rio já não é mais aquele. Agora o senhor me deixar ir, pois, já que não tem nenhum Sapo por aqui, tenho outros peixes para atender.

A TARTARUGA SAI DE CENA VAGAROSAMENTE. O PEIXE PROCURA O SAPO POR TODA A CENA.

Peixe             – Aonde foi parar aquele Sapo? Ele não aguentava nem respirar. Não pode ter ido assim tão longe.

O PEIXE SE SENTE CANSADO. TOSSE MAIS UM POUCO. OLHA O COMPRIMIDO E RESOLVE TOMÁ-LO.

Peixe             – Vai ver eu tô mesmo ficando maluco! Será que to ficando doente de verdade?

O PEIXE SE SENTA EM UMA PEDRA.

Peixe             – Às vezes eu tenho saudades daquelas águas claras, agora é tudo embaçado! Vai ver que, de repente, nem era um Sapo! Será que não era um Sapo? Ou será que era? Aiaiaiaiai! A água desse rio não deve estar mesmo me fazendo bem!

O SAPO ENTRA EM CENA COMO TIVESSE CAÍDO DOS PANOS.

Peixe             – É você, Sapo?

Sapo              – Olá meu amigo, você pode me ajudar a voltar pra superfície?

Peixe             – Aonde você se meteu?

Sapo              – Eu tentei chegar na superfície, mas quando já estava quase saindo da água, esses panos arrebentaram e cai novamente no fundo do rio.

Peixe             – Sei! Foi saiu pendurado! O senhor Sapo ta querendo me por maluco?

Sapo              – Primeiro, eu não sou Sapo, eu estou Sapo!

Peixe             – Como?

Sapo              – Eu na verdade sou um Rei. A bruxa da mãe da namorada do meu filho, me jogou esse feitiço porque meu filho não quis mais casar com a filha dela. Então, ela me transformou neste Sapo e me jogou dentro deste rio.

Peixe             – Sei.

Sapo              – E tem mais, eu sou o dono de todo esse lugar, este rio, inclusive é meu, pois está na minha propriedade.

Peixe             – Ah, quer dizer que este rio é seu?

Sapo              – Sim! E tudo o que está dentro.

Peixe             – Quer dizer que então o senhor Sapo Rei é o responsável pela poluição do meu lar? Porque se o nobre Rei não sabe, aqui é meu lar! Meu e de várias outras espécies que estão morrendo. E olha só como está isso aqui. Olha as águas, não se vê um palmo a nossa frente, de tanta lama, tanto esgoto, olha só esses lixos, plásticos e sujeiras. Olha só o meu estado, todo sujo, todo cheio de lama, óleo e de esgoto. E quer dizer que tudo isso é culpa sua? E o senhor ainda quer a minha ajuda? Se vira, senhor Sapo Rei!

O PEIXE SAI DE CENA, ENFURECIDO.

Sapo              – Ei, seu Peixe, eu não sabia que isso estava assim! Eu prometo mandar limpar esse rio quando voltar a ser Rei. Volte aqui.

O SAPO COMEÇA A SENTIR DIFICULDADE DE RESPIRAR.

Sapo              – Seu Peixe! Seu Peixe. Por favor! Eu não estou conseguindo mais respirar direito. Me ajude a chegar até a superfície. Eu… Eu…

O SAPO DESABA NO CHÃO. ENTRA A TARTARUGA.

Tartaruga      – Olha só, não é que o Peixe tinha razão! Um Sapo caído no fundo do rio. Será que ele ainda está vivo?

A TARTARUGA PEGA O SEU ESTETOSCÓPIO E EXAMINA O SAPO. FAZ MASSAGENS NO PEITO E RESPIRAÇÃO BOCA A BOCA. O SAPO RESPIRA.

Tartaruga      – Muito bem, ainda está vivo!

Sapo              – (FALANDO E RESPIRANDO COM DIFICULDADE) Por favor, me ajude!

Tartaruga      – Como o senhor chegou até aqui?

Sapo              – (FALANDO E RESPIRANDO COM DIFICULDADE) Foi a bruxa!

Tartaruga      – É, essa água poluída não está fazendo bem para os habitantes deste lugar. Muita poluição deve estar afetando a mente de todos por aqui.

Sapo              – (FALANDO E RESPIRANDO) Eu não sou Sapo, eu sou um Rei!

Tartaruga      – Ih, o seu caso deve ser muito pior que eu imaginava. O senhor já está delirando! Precisamos levá-lo para um hospital urgente!

Sapo              – (CONTROLANDO A RESPIRAÇÃO) Não, eu só preciso voltar para superfície. Preciso respirar.

Tartaruga      – O senhor tem certeza que está bem? Olha lá, hein? Eu como médico tenho o dever de zelar por sua saúde.

Sapo              – E eu como Rei, deveria zelar por esse rio. E é isso que vou fazer assim que voltar a ser Rei. Eu preciso sair daqui.

Tartaruga      – Vou ter que lhe receitar uns remedinhos.

Sapo              – Não precisa! Preciso que a Dra. Tartaruga me ensine o caminho para a superfície.

O SAPO JÁ COMEÇA A RESPIRAR NOVAMENTE COM DIFICULDADES.

Tartaruga      – Mas isso é muito fácil!

A TARTARUGA APONTA PARA UM DOS LADOS DO PALCO.

Tartaruga      – O senhor segue por aquela direção que aos poucos o senhor chega à margem do rio.

Sapo              – Muito obrigado, Dra. Tartaruga! Até logo!

Tartaruga      – Ei, espere!

A TARTARUGA TIRA DO BOLSO DO JALECO, UM RECEITUÁRIO E UMA CANETA. ESCREVE.

Tartaruga      – Leve essa receitinha. Tome esses comprimidinhos três vezes ao dia até o senhor melhorar.

A TARTARUGA ENTREGA A RECEITA AO SAPO.

Sapo              – A Dra. Pode me emprestar sua caneta?

Tartaruga      – (ENTREGANDO A CANETA) Claro que sim!

O SAPO ESCREVE NO VERSO DA RECEITA E A ENTREGA À TARTARUGA.

Sapo              – Quando a Dra. encontrar o Peixe, faça o favor de entregar esse bilhete para ele.

Tartaruga      – Mas e a receita!

Sapo              – Eu não vou precisar!

O SAPO SAI SALTITANTE POR UM DOS LADOS DO PALCO.

Tartaruga      – É, a vida no fundo deste rio já não é mais a mesma. Saudade de quando as águas eram claras e menos poluídas por aqui. A vida aqui embaixo era mais saudável, hoje em dia, tudo parece de ponta cabeça. Deve ser toda essa sujeira que despejam dentro deste rio. Bom, deixe eu caminhar que há muito a se cuidar.

A TARTARUGA VAI SAINDO VAGAROSAMENTE. ENTRA O PEIXE.

Peixe             – Dra. Tartaruga! Dra. Tartaruga. Espere!

A TARTARUGA PARA E SE VIRA.

Peixe             – A senhora não viu o Sapo?

Tartaruga      – Vi sim!

Peixe             – Viu só como eu não estava louco!

Tartaruga      – É verdade! Mas aquele Sapo não está bem. Disse-me que era um Rei.

Peixe             – E para onde ele foi?

Tartaruga      – Eu lhe ensinei o caminho até a margem. Já se foi. Até mais! E vê se você se cuida, porque sua saúde não está nada boa.

O PEIXE BUSCA UM POUCO DE AR E DEPOIS TOSSE BASTANTE.

Peixe             – Eu não tenho nada!

Tartaruga      – Ah! Eu já ia me esquecendo. O Sapo Rei pediu que eu lhe entregasse esse bilhete.

A TARTARUGA ENTREGA O BILHETE E SAI DE CENA, VAGAROSAMENTE. O PEIXE SE SENTA SOBRE UMA PEDRA.

Peixe             – (LENDO O BILHETE) “Meu amigo Peixe, queria em primeiro lugar pedir desculpas pelo meu povo tornar a sua casa assim tão suja e estar fazendo tão mal à vida de vocês todos. Não sabia que as coisas estavam tão ruins assim aqui embaixo, mas estou lhe dando minha palavra de Rei, que assim que voltar a ser Rei de novo, vou limpar todo esse lugar. Palavra de Rei!”

O PEIXE COMEÇA A TREMER E A TOSSIR.

Peixe             – Será que o Sapo é mesmo Rei?

BLACK-OUT. FOCO NO PROSCÊNIO COMO SE VOCÊ A BEIRA DO RIO. O SAPO JÁ TRANSFORMADO EM REI, SE TOCA.

Rei                 – Finalmente o feitiço daquela bruxa chegou ao fim. Mas ele vai me pegar, ah, se vai!

O REI SE VIRE PARA TRÁS E OLHA PARA O CHÃO TENTANDO VER O SEU REFLEXO NA ÁGUA.

Rei                 – Não consigo ver direito o meu reflexo nessa água! Como essa água está suja! (LEMBRANDO DE ALGO) O Peixe! Eu prometi ao peixe que iria dar um jeito na poluição desse rio. Conselheiro! Guardas! Quando a gente precisa, não encontra ninguém! Mas deixa estar, vamos ao que interesse:

O REI, SE DIRIGINDO À PLATEIA

Eu, o Rei de todo este reino, decreto que a partir de hoje, está proibido poluir os rios deste lugar e quem não cumprir sofrerá as penas da lei! Que se cumpra a ordem do Rei!

APAGA-SE O FOCO DO REI. FOCO NO CENTRO DO PALCO. O PEIXE TREME E TOSSE SEM PARAR. A LUZ VAI CAINDO EM RESISTÊNCIA À MEDIDA QUE O PEIXE VAI DESFALECENDO.

– FIM –


TAVA MUITO BOM PRA SER VERDADE!

março 22, 2019

AUTOR

Paulo Sacaldassy

Personagens

Eugênio

Madalena

Fiscal

CENÁRIO: SALA DE UM ESCRITÓRIO, UMA MESA GRANDE, UMA CADEIRA ALTA, DOIS SOFÁS, UMA MESINHA E UM BAR DE CARRINHO COM ALGUMAS GARRAFAS DE BEBIDAS, VAZIAS. AO FUNDO UMA JANELA QUE DÁ PARA RUA.

AO ABRIR ÀS CORTINAS, ESTARÃO EM CENA, UM HOMEM, VESTINDO UM TERNO CAFONA E COM UMA PASTA EXECUTIVA DO TIPO 007, ANTIGA E UMA MULHER TAMBÉM VESTIDA DE FORMA CAFONA.

Eugênio        – Olha só, Madalena, tudo saiu melhor do que a encomenda, acabamos com as nossas dívidas e ainda ganhamos de quebra essa indústria. Agora sim a vida vai começar pra gente!

Madalena      – E olha que nem precisei fazer nada daquilo com o Salvador. O velho caiu na cama e puft! Roncou mais que um porco, coitado!

EUGÊNIO VAI ATÉ O BAR PROCURA ALGUMA GARRAFA COM BEBIDA, MAS NÃO ACHA NADA, PEGA DOIS COPOS E ENTREGA UM À MADALENA. OS DOIS BRIDAM COM OS COPOS VAZIOS.

Eugênio        – Ao fim das dívidas!

Madalena      – Não dá azar brindar de copo vazio, benhê?

Eugênio        – Que nada, minha lindeza! Agora a gente ta é rico!

Madalena      – Que dizer que agora vou ser madame? Que nem aquelas artistas da televisão, que passam o dia todo na academia mostrando o corpão pela internet?

MADALENA PEGA O CELULAR FAZ DIVERSAS SELFIES COM POSE DIFERENTES

Madalena      – Depois vou postar tudo pra matar as inimigas de inveja!

MADALENA CONTINUA A TIRAR SELFIES.

Eugênio        – Madalena, a minha madame! Gostosa!

EUGÊNIO DÁ UM TAPA NA BUNDA DE MADALENA E DEPOIS UMA BITOCA. COMEÇAM A SE OUVIR GRITOS DO LADO DE FORA.

Em OFF         – “Não queremos lixo!” Não queremos esgoto!” “Fechem a indústria!” “Não a poluição!” “Fechem a indústria!”

EUGÊNIO VAI ATÉ A JANELA NO FUNDO DO PALCO.

Madalena      – (AINDA TIRANDO SELFIES) Que ta acontecendo aí, hein Eugênio?

VOLTA AO CENTRO DA CENA.

Eugênio        – Tá cheio de gente lá fora com um monte de cartaz! Acho que tão fazendo alguma manifestação contra alguma indústria.

Madalena      – Deixa isso pra lá! Afinal isso não é da nossa conta, não é mesmo?

MADALENA SE DEITA EM UM DOS SOFÁS.

Eugênio        – É verdade! Vamos ver por onde começar.

EUGÊNIO VAI E SE SENTA NA POLTRONA DA MESA. COMEÇA A FOLHEAR PAPÉIS ESPALHADOS SOBRE A MESA.

Eugênio        – Isso aqui ta uma bagunça. Não sei como o Salvador se entendia com isso aqui.

Madalena      – Aquele agiota só queria saber de dinheiro. Nem de mim ele quis saber. Dormiu, aquele velho babão!

Eugênio        – Ainda bem, Madalena. Ainda bem!

Madalena      – Ai, benhê, não fala assim comigo que eu fico me sentindo feia!

Eugênio        – Você é linda, Madalena! Minha Deusa! A mulher que me deu a sorte grande. Olha só. Agora eu sou um empresário.

Madalena      – Somos, viu, seu Eugênio! Somos. Não vai pensando que vai ficar com isso tudo sozinho.

Eugênio        – Tudo que é meu é seu, tudo que é seu é meu!

OUVE-SE UMA BATIDA NA PORTA.

Eugênio        – Vai atender, Madalena.

Madalena      – Eu não! Vai você!

Eugênio        – Vai! De repente é alguém querendo comprar nossos produtos.

Madalena      – Mas o quê a gente vende?

Eugênio        – O quê a gente vende? Não sei. Vai abrir logo aquela porta Madalena. Faz de conta que você é a minha secretária.

Madalena      – Sou sua sócia!

NOVAS BATIDAS NA PORTA.

Eugênio        – Anda, Madalena!

MADALENA VAI ATÉ UM DOS LADOS DO PALCO E VOLTA NA COMPANHIA DE UM HOMEM.

Eugênio        – Pois não? O senhor se sente, por favor?

Fiscal             – Quero falar com o responsável pela empresa.

Eugênio        – (ESTENDENDO A MÃO) Está falando com ele: Eugênio dos Anjos.

Madalena      – E também sou dona: Madalena dos Anjos.

Fiscal             – Bom, senhor Eugênio, dona Madalena, eu só o fiscal do meio ambiente e estou aqui para fechar a indústria de vocês.

Eugênio        – Como assim?

Madalena      – Como assim?

Fiscal             – Está indústria já vem há tempos descartando lixo nas encostas do rio, despejando dejetos químicos no leito do rio, contribuindo para a poluição das águas que abastecem à cidade, causando um grave problema de saúde pública para a população.

Eugênio        – Deve estar havendo algum engano.

Madalena      – É moço! Acabamos de ganhar essa indústria do Salvador. Nem sabemos o que ela vende.

Fiscal             – A mim não interessa quem comprou, quem vendeu, o que tenho que fazer é cumprir com minha obrigação e fechar essa indústria.

Eugênio        – Mas, senhor fiscal… Como é mesmo seu nome?

Fiscal             – Adamastor.

Eugênio        – Então, senhor Adamastor. Sente-se, por favor. Madalena, traz um café por seu Adamastor.

Madalena      – Mas não tem café!

Eugênio        – Se vira, Madalena! Dá um jeito. Vai buscar.

Fiscal             – Não precisam se preocupar, o meu trabalho vai ser rápido.

Eugênio        – Que preocupação o quê? Vai, Madalena!

Madalena      – Tá bom, Eugênio, ta bom!

MADALENA SAI DE CENA. GRITOS DA MANIFESTAÇÃO VINDOS DO LADO DE FORA.

EM OFF         – “Fechem a indústria!” “Não a poluição!” “Fechem a indústria!” “Não a poluição!”

Fiscal             – Olha, o senhor está ouvindo? É a voz da população que não aguenta mais tanto descaso com o meio ambiente.

Eugênio        – Mas, Adamastor… Eu posso lhe chamar assim, não posso?

ADAMASTOR FAZ QUE SIM COM A CABEÇA.

Eugênio        – Então, Adamastor, como eu ia lhe dizendo… Nós acabamos de chegar na cidade, ganhamos essa indústria como parte de uns serviços que minha esposa prestou ao Salvador e a gente não tinha ideia do que ia encontrar, agora você chega aqui já querendo fechar a indústria? Não sei nem o quê essa indústria vende?

Fiscal             – Olha aqui, seu Eugênio, infelizmente não posso lhe ajudar, estou apenas cumprindo ordens.

Eugênio        – Mas sempre tem um jeitinho, não é? Eu nunca fui empresário, mas sei que empresário sempre dá um jeitinho.

Fiscal             – Se o senhor começar nesse tom, a gente vai ter problema, seu Eugênio!

Eugênio        – Eu quero que o amigo entenda o meu lado.

MADALENA ENTRA EM CENA DE SHORTINHO E AVENTAL, COM UM DECOTE GENEROSO, CARREGADO UMA BANDEJA COM CAFÉ,

Eugênio        – Que isso, Madalena?

Madalena      – O café!

Eugênio        – Essa roupa Madalena!

Madalena      – Me lembrei do Salvador!

Eugênio        – E aonde você arrumou isso?

Madalena      – Sou uma mulher prevenida, benhê!

Fiscal             – Bom, não tenho mais tempo.

Madalena      – (SE OFERECENDO AO FISCAL) Toma um cafezinho, seu moço!

O FISCAL MIRA OS OLHOS NO PEITO DE MADALENA.

Eugênio        – Madalena!

Madalena      – Deixa o moço vê, Eugênio. Vê não tira pedaço.

O FISCAL PEGA A XÍCARA DE CAFÉ E BEBE EM GOLE SÓ. QUEIMA A LÍNGUA. MADALENA VAI AO SEU SOCORRO.

Eugênio        – Madalena!

Madalena      – Ai, benhê! O moço queimou a língua! Tadinho!

Fiscal             – Está tudo bem. Está tudo bem.

Eugênio        – Então estamos resolvido, o fechamento está cancelado, certo?

Fiscal             – Não senhor! Ainda tem mais!

Madalena      – Mas o quê?

Fiscal             – Além de fechar a indústria, vu ser obrigado a aplicar uma multa pelos danos causados ao meio ambiente.

Eugênio        – Não faz isso comigo. Adamastor!

Fiscal             – Desculpe, senhor Eugênio, é a lei!

Madalena      – E se a gente pagar a multa, o moço deixa a indústria aberta?

Eugênio        – Isso! A gente promete cumprir tudo direitinho o quê o amigo exigir.

Fiscal             – Infelizmente eu não tenho autoridade pra isso.

Eugênio        – Poxa, Adamastor quebra essa…

Fiscal             – Olha esse seu tom…

Madalena      – Mas porque o moço quer fechar a nossa indústria?

Eugênio        – Culpa daquele velho, agiota, vigarista do Salvador, Madalena!… Você sabia que essa indústria joga o lixo nas margens do rio, despeja dejetos químicos dentro do rio, polui a água do rio e que essa água está causando doenças na população desta cidade?

Madalena      – Ah, é só por causa disso que o moço quer fechar nossa indústria?

Fiscal             – A senhora acha isso pouco?

Madalena      – Olha aqui seu moço, lá na comunidade que a gente morava, também tinha um monte de lixo espalhado, as indústrias de lá jogavam o esgoto dentro no córrego que passava lá do lado da comunidade, tinha rato, barato, mosca, e ninguém ia lá pra ajudá a gente não, viu? As indústrias de lá continuam a fazer tudo isso e ninguém faz nada. E agora o moço quer fechá a nossa indústria,, que a gente nem abriu ainda? Isso não pode! Isso é uma injustiça!

MADALENA SAI LEVANDO A BANDEJA, FURIOSA.

Fiscal             – Sua mulher até tem razão, mas eu não posso fazer nada. EU cumpro ordens. O quê eu posso fazer, como o senhor tá chegando aqui agora, é só aplicar uma multa pelas infrações já cometidas e lhe dá um prazo de trinta dias para que tudo esteja de acordo. Estando tudo de acordo, o senhor vai ter a autorização para abrir sua indústria de novo.

Eugênio        – Fechado! O senhor pode calcular a multa que eu vou buscar a Madalena que ta com o dinheiro.

EUGÊNIO SAI DE CENA. O FISCAL CALCULA A MULTA. GRITOS DA MANIFESTAÇÃO VINDOS DO LADO DE FORA.

EM OFF         – “Chega de poluição!” “Fechem a indústria!” “Fechem a indústria!”

EUGÊNIO VOLTA COM MADALENA.

Eugênio        – Tudo calculado?

Fiscal             – Só mais um minutinho!

Eugênio        – Cadê o dinheiro que sobrou?

Madalena      – Acabou, Eugênio! Hotel, champanhe, comidinha…

Eugênio        – E não sobrou nada?

Madalena      – Só o que ficou com você. Tem algum?

Eugênio        – Não sei. Acho que uns mil.

Madalena      – Será que dá pra pagar a multa?

Eugênio        – Acho que dá. Quanto deve ser essa multa? Então, Adamastor, tudo pronto?

Fiscal             – Tudo pronto!

O FISCAL ENTREGA A INTIMAÇÃO COM O VALOR DA MULTA PARA EUGÊNIO, QUE DESMAIA.

Madalena      – Eugênio! Eugênio! O senhor matou meu marido!

Fiscal             – Não era a minha intenção.

Madalena      – Fala comigo, Eugênio!

Fiscal             – Bom, já fiz o meu trabalho, agora preciso ir. Passem bem!

Madalena      – O moço pode ficá aí! Só sai daqui depois que meu marido acordá!

Fiscal             – Preciso mesmo ir!

Madalena      – O moço fica!

MADALENA PEGA O PAPEL DA MULTA DAS MÃOS DE EUGÊNIO.

Madalena      – O quê? O moço só deve estar maluco! O senhor sabe quanto é isso aqui? Por acaso o moço ganha isso por ano?

Fiscal             – Olha, Dona Madalena, não fique nervosa. Eu quero que a senhora entenda, é o meu trabalho.

Madalena      – Trabalho? Isso aqui é dez mais o quê o Eugênio devia pro agiota! O moço só pode estar brincando!

Fiscal             – Dona Madalena, veja bem!

Madalena      – Veja bem, nada! Olha só o que o moço fez com o meu marido. Eugênio! Eugênio!

EUGÊNIO VAI SE LEVANTANDO COM DIFICULDADE.

Madalena      – Tá melhor, Eugênio? Fala comigo!

Eugênio        – Tô vendo tudo embaçado!

EUGÊNIO SE APOIA EM MADALENA.

Fiscal             – Bom, já que o senhor Eugênio está bem, estou indo. Daqui a trinta dias eu volto para pegar o comprovante da multa e ver se a indústria está agindo dentro de todas as leis que protegem o meio ambiente. (O FISCAL MIRA NOVAMENTE O DECOTE DE MADALENA). Passar bem, Dona Madalena.

O FISCAL SAI.

Eugênio        – Acho que tive um sonho daqueles!

MADALENA COLOCA EUGÊNIO EM UM DOS SOFÁS.

Madalena      – Você ta melhor?

Eugênio        – Sabe, Madalena, eu sonhei que o Salvador tinha dado uma indústria pra gente, aí chegou um fiscal e disse que ia fechar a nossa indústria, porque a nossa indústria jogava lixo no rio, despejava produtos químicos no rio, poluía as águas do rio e causava doença na população da cidade, depois, o fiscal desistiu de fechar e deu uma multa de…

Madalena      – Um milhão de reais!

Eugênio        – É verdade, Madalena!

Madalena      – É verdade!

Eugênio        – Eu vou matá aquele agiota!

EUGÊNIO SAI DE CENA, FURIOSO, MADALENA VAI ATRÁS. OUVEM-SE OS GRITOS DA MANIFESTAÇÃO VINDOS DA RUA.

EM OFF         – “Não queremos lixo!” Não queremos esgoto!” “Fechem a indústria!” “Não a poluição!”

– FIM –